Revista Magistratus - Número 5 - Setembro 2018
O que os mecanismos de compliance e a Lei Anticorrupção buscam é que cada um dos integrantes de uma organização possa ser um fiscal da regularidade de conduta orientação. Dessa maneira, os órgãos de controle interno de serviços públicos de- vem atuar no sentido de orientar, mostrar o caminho. E se houver reiterações, esta- belecer as punições”. Segundo Saldanha, um programa de integridade estabelece um mecanis- mo complexo, que deve ser estruturado pela organização para que “contamine” todos dentro dela e se tenha certeza de que a instituição está caminhando nos trilhos adequados. “O servidor deve apontar os erros e denunciar colegas que agem de forma equivocada. Quando falamos dos parâme- tros da Lei Anticorrupção, que instituiu o compliance , não estamos falando da dela- ção premiada – quando o delator cometeu também ato ilícito, mas sim de quando o delator é parte daquela organização. O que a lei busca é que cada um dos integrantes de uma organização possa ser um fiscal da regularidade de conduta”. Entretanto, para Saldanha, há ain- da grande resistência a isso, pela cultura e formação do brasileiro. “Não olhamos com bons olhos aquele que aponta o co- lega que está agindo de forma equivoca- da. Quem de nós nunca ouviu na infân- cia, em âmbito de colégio, a expressão ‘caguete merece cacete´”, disse Saldanha, que pontuou que é preciso mudar a cul- tura já na educação de base. Lei Anticorrupção Também conhecida como Lei da Empresa Limpa, a Lei 12.846/2013 visa à parceria da esfera privada com a pública no combate à corrupção. Tem como objeto a responsabilização civil e administrativa da pessoa jurídica (em- presas, associações, fundações brasilei- ras e estrangeiras com representações no Brasil) pela prática de atos contra a Administração Pública Nacional (Exe- cutivo, Legislativo e Judiciário, Federal, Estadual e Municipal) e Estrangeira. O ministro do STJ explicou que a lei introduziu de fato no Brasil o conceito de compliance e ampliou seus mecanismos. Saldanha pontuou que as empresas vêm buscando se ade- quar às conformidades do compliance sem afetar a efetividade de competição no mercado. “Essa legislação deve ser aplicada de forma eficaz para não afe- tar a atividade fim”. “Antes dessa lei, a responsabi- lidade era aquela clássica do Direito Penal: a responsabilidade subjetiva, do agente, focada na pessoa física com a necessidade de comprovação da culpa e marcada pela territorialidade. Com a Lei Anticorrupção, uma nova concep- ção surgiu: a responsabilidade passou a ser objetiva, ou seja, é pouco relevante se foi o diretor, gerente ou contador. A organização (pessoa jurídica) já está responsabilizada de antemão. A vi- são é abrangente, pois busca criar um ambiente de lisura e honestidade e naturalmente expurga os que come- tem desvio de conduta. Essa visão é marcada pelo Direito Administrativo sancionador em substituição ao Di- reito Penal. Resulta em modernidade, agilidade e resultados mais eficazes”, explicou. • “ “ M inistro A ntonio saldanha P alheiro Corrupção Antes de falar especificamente de compliance , o ministro teceu comentá- rios sobre a corrupção. “A corrupção é hoje uma preocupação mundial; o acesso à informação nos permitiu identificar que os males que ela acarreta são, na verdade, muito maiores do que se imaginava”. Quanto ao desvio da legalidade e da moralidade, Saldanha enfatizou que o Brasil não é a única nação a ter de lidar com o problema. “De 176 países analisados pela Transparência Interna- cional, 121 têm grau de corrupção ab- solutamente indesejado e que precisa ser combatido”, afirmou o ministro, citando dados oficiais do movimen- to. Saldanha reforçou que a temática adquiriu espaço central nas agendas de todas as organizações, desde gover- nos a empresas públicas e privadas. Para Saldanha, a corrupção só será inibida se cada indivíduo praticar o exercício da autocrítica. “Somente vamos inibir a corrupção se tentarmos moralizar individualmente e coletiva- mente tudo aquilo que vimos de erra- do. Várias instituições que compõem o sistema nacional estão corrompidas com atos de desvio, de imoralidade e de improbidade. Essa corrupção sistêmica deve ser combatida, mas há uma cor- rupção que antecede a essa: a corrupção endêmica, que é a corrupção de cada um de nós, a corrupção na nossa con- duta do dia a dia, de trafegar pelo acos- tamento, de ultrapassar um sinal de trân- sito, de instalar um ‘gato’ de luz. Essa é a pior corrupção, pois está entranhada”. “Precisamos fazer um exercício de autocrítica, nos perguntar: ‘O que estou fazendo de errado’? Ética é não fazer com os outros aquilo que não quer que façam com você”, disse. Foto: Finatec
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz