Revista Magistratus - Número 4 - Maio - 2018
17 2018 Revista Magistratus Quem foi José Carlos Barbosa Moreira P rocurador do Estado, desembargador do TJRJ e professor titular de Direito Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Barbosa Moreira morreu em agosto do ano passado, aos 85 anos. Carioca da Tijuca, zona norte do Rio, ele era filho de pro- fessores e dedicou quase trinta anos de sua vida aos alunos de Direito. Na juventude, queria ser diplomata, mas se apaixonou pelo Direito desde o início da faculdade, em 1950. Doze anos depois, passava em primeiro lugar no primeiro concurso para a Procuradoria do Estado da Guanabara, onde trabalhou por 15 anos. Deu aulas em escolas e em cursos de mestrado, mas seus preferidos eram os alunos do bacharelado. Era considerado um professor exigente e muito querido, que sabia os nomes de todos os alunos. “Para ser um bom professor, a primeira exigência é que você goste de ser professor. Acho que boa parte das me- lhores horas da minha vida se passaram em sala de aula ou em reunião com alunos ou ex-alunos”, costumava dizer. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presi- dente do Tribunal Superior Eleitoral, Luiz Fux, foi aluno e esta- giário de Barbosa Moreira. Em entrevista à TV Globo, na oca- sião da morte de Barbosa Moreira, ressaltou: “Além de ser um jurista respeitado mundialmente, eu considero o professor José Carlos Barbosa Moreira o maior professor de todos os tempos, pela didática, pela profundidade, pela ética e pela dignidade”. “José Carlos escrevia primorosamente bem, dominava como poucos os conceitos da sua matéria, era carismático e dotado de grande seriedade científica. Era uma dessas pessoas que muda a vida das outras pelo exemplo e pela generosidade”, afirmou o mi- nistro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, tam- bém ex-aluno, em entrevista para o jornal Folha de São Paulo. O professor passava horas pesquisando. Costumava dizer que vivia escrevendo, porque a sua obra precisava ser sempre atualizada. Considerado por muitos como um dos maiores pro- cessualistas do Brasil, deixou um legado que se perpetuará por meio das suas obras acadêmicas, dentre elas: “Litisconsórcio uni- tário”, “Questões prejudiciais e coisa julgada”, “Comentários ao Código de Processo Civil”, “O Novo Processo Civil Brasileiro” e “Temas de Direito Processual Civil”. “M uitos foram colegas de trabalho ou alunos de José Carlos Barbo- sa Moreira, e muitos ainda podem ler suas lições e aprender com elas, mas apenas quatro pessoas tiveram o privilégio de tê -lo como pai. E se os estudiosos do pro- cesso têmmais autoridade para avaliar sua obra, ninguém melhor que um filho para falar sobre o homem. A imagem que preservo de meu pai é a de uma pessoa extremamente reser- vada, que dedicava a maior parte de seu tempo à leitura – e não me refiro apenas a temas jurídicos, mas também à literatura de ficção e a muitos outros assuntos (fi- losofia, religião, história, música clássica, viagens). Era incrível e invejável sua ca- pacidade de concentração, sobretudo se considerarmos a convivência com quatro filhos homens. Foi em nossa ruidosa com- panhia, nos anos de nossa mais remota infância, que ele escreveu suas primeiras obras, entre as quais nada menos de duas teses de concurso. Para mim, uma façanha. Um certo alheamento à vida co- tidiana é um traço comum aos homens de ciência, mas meu pai, enquanto teve saúde, costumava revelar interesse por quase tudo (coisas banais ou fúteis não despertavam sua curiosidade, menos ain- da – aqui, seu calcanhar de Aquiles – no- ções elementares sobre o funcionamento de qualquer máquina). Não era apenas um interesse por ideias abstratas e por questões de trabalho, mas também por pessoas: embora não fosse o mais comu- nicativo dos seres, nem o mais simpático, meu pai, em regra, mantinha um ótimo diálogo com colegas e, especialmente, com alunos. Não surpreende que muitos desses se tenham tornado grandes amigos pela vida afora e até cultores da mesma disciplina. Alguns dos discípulos, de viva voz ou por escrito, revelaram o que o mestre fazia, generosamente, para estimu- lá-los à produção acadêmica: empenhava- se na publicação, por editora de prestígio, dos escritos deles, antes mesmo de lhes dar conhecimento de tal iniciativa! Não é difícil, então, compreender a simpatia de meu pai por uma frase, re- cordada em ocasiões especiais, de um de seus juristas favoritos, Francesco Carne- lutti. Cito-a apenas de memória, sem ter a preocupação de reencontrá-la na vasta obra do processualista italiano: “A maior glória para o mestre não é ver-se louvado pelos discípulos, mas ver-se por eles ul- trapassado”. Traduz, sem dúvida, a crença na evolução da humanidade (não apenas da ciência) e num futuro melhor”. (Carlos Roberto Barbosa Moreira é advogado, professor de Direito Civil e filho do processualista José Carlos Barbosa Moreira) Barbosa Moreira - o pai por C arlos R oberto B arbosa M oreira O desembargador José Carlos Barbosa Moreira com sua esposa Gilka e os filhos Carlos Roberto, Márcio Celso, José Henrique e Luis Eduardo, nos anos 70
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