Revista Magistratus - Número 4 - Maio - 2018

13 2018 Revista Magistratus MAGISTRATUS: S obre a formação do juiz do novo milênio , qual é sua opinião ? SALOMÃO: Todas as carreiras, em geral, já sofrem e vão so- frer cada vez mais o enorme impacto da tecnologia. Então o pro- fissional do Direito vai ter que se redescobrir, porque a vida so- cial está mudando, as relações de emprego já não são mais como eram antes. Tudo vai mudar, vai estar na palma da mão com um aplicativo, inteligência artificial e blockchain . Os currículos das universidades também terão que ser modificados. Os concursos para a magistratura sofrerão impacto. O profissional recrutado para ser juiz terá uma mudança de perfil. Ele já vem sendo mo- dificado ao longo desses últimos anos. Se olharmos as pesquisas, o perfil do juiz logo depois da Constituição de 1988, comparado com o de hoje, é completamente diferente. Fenômenos como o ingresso de pessoas cada vez mais jovens e de mais mulheres na magistratura já causaram impacto. E olhando em perspectiva para o futuro, a tecnologia também vai causar um forte impacto. Então outro tipo de profissional será selecionado, mais afeito a essa ideia da tecnologia e a essas novas relações sociais, porque o mundo mudou, e os juízes estão mudando. MAGISTRATUS: Q ual é a importância das escolas de magistratura nesse cenário ? SALOMÃO: As escolas devem priorizar a formação desse juiz do novo milênio, que é antenado com as demandas da sociedade moderna. As nossas escolas de magistratura têm um papel funda- mental de preparação e formação de juízes e terão que se adequar a essa nova realidade. Não há Judiciário bom, funcionando bem, em nenhum lugar do mundo, se não houver juízes permanentemente bem-treinados e adequadamente selecionados. Fundamental para o desenvolvimento do Judiciário é a figura humana do juiz. levante na interpretação desses novos diplomas legais, especial- mente o CPC, para lapidar e criar os pontos que mais otimizem os processos. Já o IRDR (Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas), acredito que vai debelar o volume de processos nos tribunais locais. O ideal é que seja depurada a jurisprudência, para formar precedente com base nas decisões amadurecidas. MAGISTRATUS: E sobre o novo CPC e as S oluções E xtrajudiciais ? SALOMÃO: Os tempos mudaram. Por exemplo, os novos alunos de Direito jamais poderiam imaginar que teriam discipli- nas que abordariam mediação, técnicas de arbitragem, conteú- dos relacionados a soluções extrajudiciais e litígios. Hoje temos um arcabouço bastante interessante dentro da nossa legislação, não só em relação ao Código Civil, mas também temos o Mar- co Legal de Mediação, uma lei de arbitragem ampliada; come- çam as técnicas variadas de júri simulado, etc., de forma que o Conselho Nacional de Justiça vai se conscientizando sobre a necessidade de criar políticas públicas de soluções extrajudi- ciais fora do Judiciário. MAGISTRATUS: C omo avalia o momento que o J udiciário vive hoje ? SALOMÃO: Na minha trajetória profissional de mais de 30 anos, talvez este seja o momento mais difícil para o Judiciário. É o poder garantidor dos direitos individuais, ao mesmo tem- po em que é aquele que tem que aplicar as penalidades para as pessoas que se distanciam do cumprimento da lei. Essa tensão está nítida na quadra atual, e, no entanto, os conceitos estão de certa forma embaralhados, talvez até de propósito. A sociedade terá que se perguntar que tipo de juízes deseja ter em seus qua- dros. Se quer juízes independentes realmente ou se quer juízes que possam ser substituídos se não atenderem o que se espera deles. De outra parte, acredito que os juízes terão que pensar um pouco mais sobre a questão da influência da mídia e das próprias forças vivas da sociedade em relação ao resultado dos julgamentos. Hoje não há mais, segundo penso, a divisão clás- sica - no âmbito penal - entre juízes garantistas e punitivistas. O que há são juízes que cumprem a lei e respeitam os direitos fundamentais, e outros que julgam para além da lei e da prova dos autos, com a ânsia de fazer justiça. MAGISTRATUS: Q ue postura se deve esperar do J udiciário nesse cenário de protagonismo ? SALOMÃO: Nós temos um Judiciário dos melhores do mun- do. Se verificarmos os perfis dos Judiciários no planeta, o nosso é um dos mais independentes e que tem todas as garantias da magistratura. E é claro que uma corporação com essas caracte- rísticas, que funciona com essa independência, cria arestas e difi- culdades para seu próprio trabalho, justamente porque incomo- da. Temos que ter equilíbrio e ponderação, para encontrarmos o meio-termo nesta trajetória, que é nitidamente ascendente ao longo da história. O momento atual para o Judiciário brasileiro requer muita ponderação e equilíbrio; uma reflexão sobre o rumo até aqui e as estradas a serem percorridas. O mundo vem experimentando o que se denomina de “judicialização da vida”, esse fenômeno da judicialização desenfreada das relações sociais, políticas, econômicas e de toda ordem . ” “

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