Revista Magistratus - Número 3 - Dezembro 2017
33 2017 Revista Magistratus ESPAÇOALUNO R enan G uerra M artha L emos Aluno do Curso de Especialização em Direito Público e Privado (em nível de pós-graduação lato sensu ). Bacharel em Direito pela UFRJ. Mediador noTJRJ. Advogado pessoas estão acostumadas a perceber o Judiciário em uma situação de monopó- lio, como o único prestador de justiça na sociedade, alheias à existência da arbitra- gem e da mediação extrajudicial. Portan- to, as bandeiras de promoção da solução não adversarial estão no contrafluxo da cultura de litígio arraigada na sociedade. Logo, há um dissenso justificado acerca da obrigatoriedade de compareci- mento à primeira sessão de mediação. A imposição de um procedimento orien- tado pela autonomia da vontade é uma antinomia produzida por um sistema que privilegia a legalidade. A propósito, para o desembargador Alexandre Câmara, a interpretação literal da lei não é recomen- dada nessa questão, pois entende que é desnecessário que ambas as partes mani- festem o desinteresse na mediação, bastan- do uma delas para que a audiência não seja realizada. Seguindo essa linha pragmática, o Tribunal definiu (TJ/CGJ nº 144/2016) que a pauta deve ser liberada caso o réu manifeste desinteresse na mediação. Não obstante, o primeiro contato entre mediadores e mediandos é uma oportunidade valiosa. O procedimento se inicia com um discurso de abertura cujo caráter pedagógico tem uma voca- ção para produzir transformação cultu- ral. Para a renomada mediadora Tânia Almeida, consiste em rito de passagem da postura competitiva para a colabo- rativa, mediante a operacionalização de esclarecimentos essenciais ao compro- misso de participação. A eficiência da mediação, especial- mente nas causas de família, privilegia as necessidades das partes, além de evitar a dilação ou proliferação de processos. Por exemplo, na experiência do aluno, acom- panhando 27 mediações familiares e 54 mediações de outras naturezas, o índice de acordos nas ações de família alcançou 30%, ao passo que nas demais ações foi de apenas 15%. Cada vez mais, o Poder Judiciário reconhece a necessidade de abordar a sua própria gestão de maneira estratégi- ca. O aprimoramento dos métodos não adversariais de solução de conflitos ob- jetiva expressamente a gestão de deman- das repetitivas e de grandes litigantes. E a pacificação social vem como uma con- sequência benéfica do desenvolvimento da prestação jurisdicional. Em síntese, é evidente a eficiência dos métodos de solução consensual de conflitos. Entretanto, a insuficiência de recursos lhes impinge o risco de desfigu- rar seu caráter alternativo. A advertência acerca dos cortes orçamentários e das novas formas de contrato de trabalho decorre da observação atenta ao âmbito de concretização da norma. A adequa- ção dos instrumentos empregados só pode ser precisamente aferida na prática. Cappelletti e Garth já apontavam em 1978 que o mundo precisava efetivar direi- tos mediante mecanismos apaziguadores e dar função social às técnicas procedimentais. Entretanto, a destinação dos bens escassos é precipuamente executada pela Economia mediante critérios políticos de eficiência que raramente coincidem com o conceito jurídi- co indeterminado de função social próprio do Direito. A interdisciplinaridade dessas ci- ências é um dos desafios enfrentados pelos juristas na missão de concretizar o acesso à justiça nos dias atuais. Em uma economia de escassez, é utópico esperar que o sistema de solução de conflitos sofra um giro principiológi- co completo da legalidade para a autono- mia e passe a empregar precipuamente a solidariedade ao invés da jurisdição. Entretanto, a onda de transformação atual tem o potencial para harmonizar ambos os princípios. É razoável buscar um equilíbrio quantitativo no emprego de instrumentos judiciais e extrajudiciais, bem como um privilégio qualitativo ao protagonismo dos interessados por meio de negócios processuais ou solenidades em cartórios extrajudiciais. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Tânia. Caixa de ferramentas em mediação: aportes práticos e teóricos. São Pau- lo: Dash, 2013. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988. CÂ- MARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números 2017 (Ano-base 2016). Disponível em: <http:// www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em -numeros>. Acesso em: 04 set. 2017. MAGA- LHÃES, João Paulo de Almeida. Economia. 3. ed. V. 1. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
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