Revista Magistratus - Número 3 - Dezembro 2017

14 Revista Magistratus 2017 INSTITUCIONAL Mídia XTribunal do Júri Fórum Permanente de Mídia e Novas Tecnologias da Informação Rádio,TV, jornal, internet, mídias sociais. Em ummundo globalizado e conectado, as notícias são divulgadas on time , praticamente na hora em que acontecem. É notório que os crimes dolosos contra a vida recebematenção especial damídia, sendo amplamente divulgados nos meios de comunicação. E são exatamente os autores desses crimes que vão para o banco dos réus noTribunal do Júri. Homicídio, infanticídio e feminicídio são exemplos de crimes que geram comoção social. Ao Poder Judiciário cabe garantir os direitos dos acusados e o devido processo legal, uma vez que nenhuma instituição detéma prerrogativa de condenar ou absolver por antecipação. P ara debater a questão, a Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro reuniu magistra- dos, jornalistas e estudantes de Direito no dia 20 de outubro, para o de- bate: “A Influência da Mídia no Tribunal do Júri”. Juiz há dezoito anos e há dois anos na presidência do I Tribunal do Júri da Comarca da Capital, Carlos Gustavo Di- reito relembrou uma parte da história do Tribunal do Júri no Brasil: “Esse sistema veio para o Brasil em 1822, antes da pri- meira Constituição Imperial de 1824. O júri foi criado no Brasil para julgar os cri- mes de imprensa, porque o imperador, na época, entendia que o povo é que tinha que saber se a imprensa havia se excedi- do. Era o controle da imprensa, por mais irônico que seja”, disse. Sobre a influência da mídia nos dias atuais, Gustavo Direito tem uma opinião formada: “Os crimes de grande repercussão do Tribunal do Júri são nor- malmente crimes bárbaros, e o julgamen- to é feito por juízes leigos, que não têm a formação técnica. No meu modo de ver, com certeza, eles acabam sofrendo uma influência maior por parte da opi- nião pública, da opinião publicada, que é a mídia. E o jurado não precisa fun- damentar sua decisão, diferentemente de um juiz, que mesmo que sofra influência, vai ter que apresentar a fundamentação”. Carlos Gustavo Direito acredita que um caminho para amenizar a pos- sível influência negativa da mídia seria o jornalismo investigativo, em que todas as partes envolvidas são ouvidas. Também presente no encontro, a jornalista Adriana Cruz, responsável pela coluna “Justiça & Cidadania” do jornal O Dia, ressaltou que faz parte do traba- lho do jornalista ouvir os dois lados, por uma questão ética: “ Há uma influência da mídia, mas há também um poder de discernimento. A mídia é um aparelho ideológico. Sempre foi. E eu acho que essa é a grande virtude dela. Nós temos que olhar para a mídia e tirar o melhor dela. Tudo tem influência”. Para o presidente do Fórum Per- manente de Mídia e Novas Tecnologias da Informação da EMERJ, desembar- gador Fernando Foch - que antes de se dedicar ao Direito foi repórter -, o Tri- bunal do Júri se caracteriza pelo fato de o acusado ser julgado por seus iguais: “O cidadão é julgado pelo cidadão. Isso resulta de um processo civilizatório, que consagrou a ideia de que as pessoas de- vem ser julgadas por seus iguais. E hoje a comunicação é um fenômeno extraordi- nário, de uma intensidade extraordinária. Todo mundo sabe tudo ao mesmo tem- po, instantaneamente, e forma juízos. ” Presidente do II Tribunal do Júri por seis anos, o desembargador José Geraldo Antônio esteve à frente dos julgamentos do assassinato da atriz Daniela Perez e das chacinas da Candelária e de Vigário Geral, no início da década de 1990. Foram três cri- mes de grande repercussão, considerados “decididos” com a ajuda da mídia, mesmo antes do julgamento. Mas o desembarga- dor discorda: “A imprensa é formadora de opinião pública. Mas a influência é dentro da sociedade, não é no Tribunal do Júri. Há uma certa especulação de que a mídia faz com que haja um pré-julgamento dos ca- sos do Tribunal do Júri, mas isso não é ver- dade. Já está comprovado estatisticamente que o júri erra tanto quanto o juiz togado. Os grandes erros do Judiciário não são do Júri. Se verificarmos através da história, os erros são de juízes togados e sempre di- zem respeito à autoria do fato, em que há principalmente a influência da investigação criminal, que já vem para o Judiciário com determinados indícios estabelecidos pela autoridade policial e é encampada depois pelo Ministério Público”. O desembargador José Geraldo Antônio explica: “O homicídio não é pri- vilégio de marginal, de pobre ou de rico. Qualquer um, em determinada situação, pode destruir a vida do seu semelhante. A influência da mídia como formadora de opinião traduz uma opinião pública no momento em que ela noticia os fa- tos. Às vezes, a opinião pública já surge do próprio fato. A imprensa traduz um sentimento da sociedade. A divulgação desse sentimento é que realmente pode alterar. O primeiro sentimento que se tem contra um crime hediondo é a vin- gança. Ninguém procura saber a razão”. Mas até que ponto a atuação da mídia influencia a decisão do júri?

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz