Revista Magistratus - Número 2 - Setembro 2017

35 2017 Revista Magistratus PERFIL m aGistratus : Em que momento o estudante Elmo se interessou pelo Direito? d esembarGador e lmo : Ainda na época de colégio, em 1943, eu participei da Federação dos Estudantes de Campos. Tive a ideia de eleger os membros da Federação por meio de eleições diretas. Cada sala de aula dos colégios se transformou em uma seção eleitoral. Convidamos o professor do dia para ser diretor da seção. Foi a primeira grande lição de democracia que nós, estudantes, tivemos. E para organizar as eleições eu precisava conhecer as regras. Na época ninguém estudava legislação, muito menos o Governo (Ditadura Vargas) estimulava qualquer estudo da organização política do país. Foi o meu primeiro contato com um texto legal, o que me despertou o interesse pela carreira. Em 1948, entrei para a Faculdade de Direito de Niterói, de- pois absorvida pela Universidade Federal Fluminense (UFF). m aGistratus : O senhor tomou posse como juiz em 1962, foi um concurso muito disputado? d esembarGador e lmo : Eu fui chamado entre os 12 primeiros candidatos, tive um pouco de sorte. No concurso para juiz caíram questões de assuntos que eu dominava, como uma dissertação sobre Direito Comercial. Eu havia dado aulas de Práticas Jurídicas em uma escola de técnicas de comércio e foi fácil pra mim. Mas esse não foi meu primeiro concurso, eu já havia feito as provas para o Ministério Público e não tinha sido chamado. A magistratura me deu a independência. m aGistratus : O senhor participava ativamente das rei- vindicações de classe. A fusão do estado do Rio de Janeiro com o da Guanabara, na década de 1970, foi um momento difícil para os magistrados? d esembarGador e lmo : Havia discriminação em rela- ção aos magistrados do antigo estado do Rio de Janeiro. Os magistrados da Guanabara tinham mais benefícios financei- ros. Depois da fusão dos estados, nós tivemos que buscar os nossos direitos na Justiça. Eu participei da AMF, Associação dos Magistrados Fluminenses. E havia também a AMARJ, As- sociação dos Magistrados do Rio de Janeiro. A unificação de- morou 16 anos; foi, então, criada a AMAERJ, Associação dos Magistrados do estado do Rio de Janeiro, e eu fui o primeiro vice-presidente. m aGistratus : Como pesquisador da História do Direi- to, como o senhor avalia a diferença entre o magistrado das décadas de 1960 e 1970 e o juiz contemporâneo? d esembarGador e lmo : Eu vivenciei essa transforma- ção. Antigamente o juiz era simplesmente o aplicador da lei. Hoje ele tem que ser o aplicador da lei, mas precisa ter tam- bém o compromisso com a sociedade, precisa estar atento às transformações sociais. Não pode ser um juiz isolado, que só olha o que está na lei e aplica a lei, deve ser um juiz que en- tenda as necessidades sociais. É lógico que ele não vai mudar a lei, mas vai olhar a lei de uma maneira diferente. A lei é uma parte do Direito, é aquilo que é captado e valorizado e se transforma em norma, mas o Direito é mais amplo. É ne- cessário que o juiz conheça outras disciplinas humanas e não fique só nas disciplinas clássicas. E a Escola da Magistratura (EMERJ) tem se preocupado com isso. A visão do atual dire- tor-geral, desembargador Ricardo Rodrigues Cardozo, de que o juiz é, antes de tudo, um cidadão, e não apenas um membro do Poder Judiciário, já está quase prevalecendo na magistratu- ra. E a EMERJ tem sido um caminho, porque permite ao juiz alcançar essa nova visão. m aGistratus : O senhor é presidente de um dos 20 Fó- runs Permanentes da EMERJ e membro da Comissão da Me- mória Judiciária. Mesmo aposentado, não pensou em deixar de trabalhar? d esembarGador e lmo : Eu procuro ser útil. Eu leio dois jornais diários para ficar bem informado e continuo sen- do um estudioso. Cada dia aprendo alguma coisa. Meu traba- lho na Comissão da Memória Judiciária, no Museu da Justiça (CCMJ), é voluntário, venho aqui pelo menos duas vezes por semana. O museu foi fundado em 1988 e eu fui um grande incentivador dele. Sou presidente do Fórum Permanente de Estudos Interdisciplinares, que iniciou o trabalho de trazer para a Escola da Magistratura contribuições de professores de várias universidades. Nos nossos eventos trazemos psicó- logos, sociólogos, antropólogos e professores de outras áreas que não são jurídicas, mas que são também relacionadas ao Direito, seguindo a orientação de dar ao juiz a formação com relação à vida social em que ele atua. m aGistratus : O que o cidadão Elmo Arueira espera para o futuro da sociedade? d esembarGador e lmo : Sou um sonhador. Quero uma sociedade mais justa e a felicidade de todos. No meu modo de entender, a nossa realidade social é triste. Em um país em que a pobreza é muito grande, precisamos criar uma solução para dissolver esses focos de pobreza. Eu continuo, apesar da idade, eleitor. Não desisti de votar. Eu poderia, depois de 70 anos, deixar de votar, mas mantive meu título eleitoral e todo ano eu estou lá, contribuindo com o meu voto, exercendo o meu direito de cidadão.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz