Revista Magistratus - Número 2 - Setembro 2017

31 2017 Revista Magistratus S érgio L uiz R ibeiro de S ouza é juiz titular da 4ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital – RJ, presidente do Fórum Nacional da Justiça Protetiva e vencedor do Prêmio Innovare 2015 na categoria Juiz com o projeto “Apadrinhar – amar e agir para materializar sonhos”. ESPAÇO MAGISTRADO O usamos discordar Da atuação prática na 4ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Ca- pital – RJ, extraí a experiência de que, na grande maioria dos casos de entrega para adoção nos quais é solicitado o sigilo, a família extensa, ao tomar conhecimento dos fatos, requer a guarda da criança. Pense-se em um caso corriqueiro: a mãe da criança, em razão do uso abusivo de drogas, rompeu relações com a família, que não teve conhecimento da gravidez e do nascimento do bebê. Essa criança tem avós maternos e paternos, tios, primos etc, e será privada do convívio familiar exclusivamente em razão da desavença familiar existente naquele momento, que poderá ser superada posteriormente, quando já consumada a adoção. Dirão alguns que essa mãe não pode ser obrigada a exercer a materna- gem, e nisso estamos concordes. Há de se ter, contudo, a exata noção de quais direitos tratamos, e da possibilidade de disposição sobre eles. A mãe pode dispor do direito de exercer a maternagem, mas a ela não é dado dispor sobre o direito de seu filho, assegurado na Constituição Federal, de manter a convivência familiar (art. 227, caput ). O Estatuto da Criança e do Ado- lescente, que busca seu fundamento de validade diretamente na Constituição da República, com caráter regulamentar, obriga que sejam “esgotados os esforços para manutenção da criança ou do ado- lescente na família natural ou extensa”. Evidentemente que nunca pode- rá ser olvidado o Princípio do Atendi- mento do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Se o caso concreto demonstrar extremo risco para a geni- tora, e até para o próprio filho, caso haja a comunicação da existência da criança, deverá o juiz atuar com a prudência de- vida, assegurando o sigilo. Nos demais casos, deve ser seguido o disposto no art. 166, §3º, parte final, do ECA. A Constituição Federal assegura o conví- vio familiar, e a Lei nº 8.069/90 manda buscar primeiramente as famílias natural ou extensa. Dessa feita, se, de um lado, pode a genitora dispor de seu direito de não exercer a maternagem, não integra seu patrimônio jurídico a possibilidade de dispor do direito de seu filho à convi- vência familiar, inicialmente com as fa- mílias natural ou extensa, lembrando-se a ressalva já feita ao Princípio do Aten- dimento do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente. Nessa mesma linha de raciocínio, o genitor tem o direito de exercer a pa- ternagem, e não cabe à genitora dispor sobre esse direito. Há casos em que a ge- nitora sabe quem é o pai da criança, mas não lhe informa sequer sobre a gravidez. Mais de uma vez vi pais extremamente angustiados com a possibilidade de seus filhos irem para adoção, ao descobrirem a condição de genitores. Por fim, contrarrazoando a afirma- ção de que a criança ficará com integran- te da família extensa que não mantém com ela nenhum vínculo de afinidade, de igual forma inexiste vínculo dessa na- tureza com os pretensos adotantes, que somente a conhecem quando do início do estágio de convivência. Mais uma vez, caberá ao magis- trado, sopesando os detalhes do caso concreto, sempre tendo como norte o Princípio do Atendimento do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, decidir pelo atendimento ao pedido de sigilo, que só deve ser positivo em situ- ações excepcionais.

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