Revista Magistratus - Número 2 - Setembro 2017
30 Revista Magistratus 2017 Espaço Magistrado EntregaVoluntária de Filho para Adoção por Juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza E m se tratando de Direito da Criança e do Adolescente, inúmeras são as controvér- sias, muitas delas com exce- lentes fundamentos para os posiciona- mentos contrapostos. Assim também é quando se debate o dever de respeitar o sigilo requerido pelos genitores na entre- ga do filho, em Juízo, para colocação em família substituta. Em regra, é somente a genitora que se manifesta nesse sentido, inexistindo os dados paternos na Decla- ração de Nascido Vivo. A mãe da criança afirma não saber quem é o pai, ou alega que tem conhecimento, mas não deseja que ele e qualquer outra pessoa saibam da entrega da criança para adoção, inclu- sive seus próprios familiares. De lege lata , o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), em seu art. 13, §1º, giza que “As gestantes ou mães que manifestem interesse em entre- gar seus filhos para adoção serão obri- gatoriamente encaminhadas, sem cons- trangimento, à Justiça da Infância e da Juventude”. O art. 166, §3º, da mesma lei, determina que essa manifestação de von- tade da genitora ocorra em audiência com a presença do magistrado e do Ministério Público, “esgotados os esforços para ma- nutenção da criança ou do adolescente na família natural ou extensa”. Esses pais que desejam entregar seus filhos para adoção, abdicando do poder familiar, devem ser devidamente orientados sobre os efeitos da colocação em família substituta, mormente quanto à absoluta impossibilidade de retratação após a data da publicação da sentença constitutiva da adoção, sendo também recomendável que sejam atendidos pela equipe técnica do Juízo. Mantida a decisão de entrega da criança pela genitora, essa pode infor- mar ter ciência da paternidade e/ou que a criança tem família extensa, mas que deseja manter sua decisão em absoluto sigilo, pedindo expressamente que ne- nhum familiar seja comunicado da exis- tência do bebê e da entrega para adoção. Muitos juízes respeitam o desejo de sigilo da genitora e ultimam as pro- vidências para colocação em família substituta. Os defensores desse posicio- namento afirmam que, caso o Judiciário não acate o pedido de sigilo, a genitora poderá dizer que desistiu da entrega em Juízo, e simplesmente proceder à entrega irregular do filho para terceiros. Ade- mais, tornando-se de conhecimento comum esse proceder do Judiciário, outras mães, em situações análogas, não procurariam a Vara com competên- cia em Infância e Juventude, e fariam a entrega irregular das crianças, iriam abandoná-las etc. A busca da família extensa, portanto, acabaria por preju- dicar a adoção hígida dessas crianças, submetendo-as a toda sorte de riscos, inclusive ao tráfico de pessoas. Também embasa esse posiciona- mento a crença de que a mantença da criança com a família extensa causará sofrimento psicológico para aquela, que irá conviver com a genitora que a rejei- tou, e nunca receberá o mesmo amor dedicado aos filhos de seus guardiães legais. Não obstante, a busca pela famí- lia extensa deve ser direcionada somen- te aos familiares que vivenciam alguma relação de afeto com a gestante, e não aos familiares que não mantêm qual- quer outro vínculo com a mãe da crian- ça senão o de consanguinidade. De lege ferenda , há proposta de alteração do ECA para determinar que seja garantido o sigilo sobre a entrega.
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