Revista Magistratus - Número 1 - Junho 2017
13 2017 Revista Magistratus Para Ilona é preciso pensar a po- lítica de drogas como uma questão de saúde pública e não apenas de seguran- ça. Segundo a especialista, o modelo de descriminalização do uso das drogas aplicado por mais de 30 países obteve êxito, já que em nenhum deles houve o que chamou de “explosão” de consumo. Na opinião da estudiosa, os passos a serem dados pelo Brasil quanto à política de drogas seriam: retirar o consumo de drogas da esfera criminal; realizar estudos para definição de critérios objetivos para o consumo; investir recursos financeiros na saúde pública com políticas de redução de danos e tratamentos mais eficazes; e regular a maconha para o uso medicinal. Ilona foi coordenadora executiva da Comissão Global de Políticas sobre Drogas entre 2011 e 2016 e, anteriormente, coordenou o secretariado da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia Políticas de drogas no Brasil Um mercado em pleno crescimento agravado, ainda, pelo fato de o Brasil ser rota do tráfico internacional de drogas, explicou Ilona. Pontuou que o país está atrasado em relação a outros da América do Sul, no que diz respeito à descrimina- lização do consumo. Ela esclareceu que a Lei de Drogas Brasileira (Lei 11.343/06) afastou a pena de prisão para consumo pessoal, mas a conduta continua sob a esfera penal, e apesar de a Lei diferenciar o usuário/dependente do traficante, os critérios são subjetivos. Disse que a refe- rida Lei aumentou a pena mínima para o tráfico de drogas, mas não distinguiu atos preparatórios do ato do tráfico em si. “Em 2006 tivemos uma lei bem-in- tencionada no sentido de afastar a pena de prisão para o usuário e diferenciar a questão do uso e do tráfico. Porém não estabeleceu critérios objetivos para dizer quem é usuário e quem é traficante, fica à discricionariedade do policial, que avalia o contexto e as características do indiví- duo, como cor da pele, local onde mora, profissão, antecedentes criminais. Entre- tanto, muitas vezes há situações equivo- cadas”. E apresentou os seguintes dados: “Cerca de 70% das mulheres presas são por crimes relacionados a drogas, e de homens, 30%. “Em relação às mulheres, na sua maioria, não são pessoas violentas que ameaçam a sociedade, muitas são o que chamamos de ‘mulas’, transportam drogas”. Para Ilona, a Lei está sendo aplicada de forma a piorar as estatísticas no país. “Quando olhamos para a Lei de Drogas e a segurança pública nos deparamos com dados horríveis do Brasil: somos o campeão mundial em homicídios, há décadas; estamos entre os 10 mais vio- lentos do mundo; em relação ao número de mortes, o Brasil também é campeão, com cerca de 60 mil mortes violentas to- dos os anos. Desses homicídios, 70% são com arma de fogo, e a entrada de armas no país também está relacionada com as drogas, com o lucro do tráfico. Além dis- so, somos o 4º país que mais encarcera, com 656 mil presos, liderado este ranking pelos EUA, China e Rússia. Em 2017, vivemos uma crise sem precedentes no sistema carcerário. Temos déficit de va- gas no sistema prisional de 250 mil e de mandados de prisão em aberto de 200 mil. Dentro do sistema penitenciário, 150 presos foram assassinados nos primeiros meses de 2017”. Apresentou ainda dados estaduais referentes à pesquisa feita pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janei- ro: Em 2015, a polícia prendeu 12 mil usuários de drogas e 13 mil por tráfico. Pontuou que um policial leva, em média, três horas do seu tempo para registrar essas ocorrências, e após, os autos se- guem para o Ministério Público e para o Judiciário. “Há alocação de tempo e de recursos para essas 12 mil ocorrências. Considerando o fato de que somos um país que não chega a elucidar nem 8% dos homicídios, conclui-se que esses re- cursos poderiam estar sendo usados em outras ocorrências”, alertou.
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