Revista da EMERJ - V.25 - n.1 - Janeiro/Abril - 2023
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 130-146, Jan.-Abr. 2023 139 exigência de produtividade somada à evolução progressiva do controle do tempo e do espaço pode ser tão infinitesimal, isto é, refinada, precisa e amiúde que passa a exigir uma performance inexecutável para o ser humano enquanto repleto de subjetivida- de e limitado fisicamente. Desse modo, os efeitos do poder – não somente os que se relacionam com as atividades laborais – permeiam a sociedade no nível das relações de uma forma generalizada. Portanto o discurso relativo a esse mesmo poder não incidiria apenas sobre as classes baixas da sociedade, mas nesta como um todo. Des- se mesmo modo, a propagação do poder disciplinar durante a Revolução Industrial veio acompanhado pela incorporação da mentalidade que deslegitima o “ócio”, de forma que toda a so- ciedade se encontraria numa posição que se sujeita à posição pri- vilegiada conferida ao trabalho. Dentro do nosso propósito, podemos afirmar que, quando a produtividade se sobrepuja à qualidade de vida, as consequ- ências são devastadoras. A ninguém é permitido parar. E essa proibição, como vimos, não necessita mais de um agente externo, mas é garantida pela mentalidade de cada indivíduo. É a tecno- logia disciplinar que incide muito além do corpo, sendo capaz – através de tal refinamento – de penetrar a alma, recrutando sem custos cada indivíduo para ser vigilante de si e dos demais. As técnicas disciplinares – das quais fala Foucault – são capazes de moldar a subjetividade, e não é possível escapar delas, que for- matam tanto a sujeição quanto os ideais de liberdade. Aqui neste trabalho, estamos explorando o quão negativas essas consequên- cias podem se apresentar, se manifestando de diversas formas: na vergonha do funcionário que se vê desempregado, demitido para corte de gastos; na compulsão dos recém-categorizados workaholics , que nem mesmo nas férias conseguem parar de tra- balhar; nos consequentes índices de aumento de ansiedade; e se manifesta até em formas legitimadas pelo Estado, como através da oficialização da exploração no trabalho e até mesmo através de mecanismos do direito, como veremos a seguir.
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