Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 74-100, Set.-Dez. 2022  95 bilizadas por conteúdos gerados por terceiros. E, com relação à possibilidade de realizarem atos de censura prévia em relação a postagens de seus usuários, parece-nos (numa análise super- ficial sobre o tema) que a medida estaria em consonância com a ordem constitucional daquele país, considerando o disposto na chamada “teoria da state action ”. É que, conforme esclarecem SARMENTO e GOMES (2011, p. 63), prevalece no cenário norte- -americano a ideia de que os direitos fundamentais, previstos no Bill of Rights da Constituição daquele país, impõem limitações apenas para os Poderes Públicos e não atribuem aos particula- res direitos frente a outros particulares, com exceção apenas da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão. A doutrina da state action , vale dizer, teria como justificativa os princípios liberais e o pró- prio modelo federalista norte-americano e objetivaria preservar a autonomia privada e, sobretudo, a dos Estados-membros. Tal teoria foi flexibilizada a partir da década de 1940, quando a Su- prema Corte passou a adotar a chamada public function theory , segundo a qual quando particulares agem no exercício de ativi- dades de natureza tipicamente estatais, estão também sujeitos às limitações constitucionais (p. 63-64). A menção ao episódio vivenciado pelo ex-presidente ame- ricano tem como único intuito levantar alguns questionamentos necessários para a construção de um modelo regulatório brasi- leiro, voltado ao combate à desinformação propagada nas redes sociais. Vimos que, no caso americano, as empresas que se carac- terizam como neutras e, por isso, irresponsáveis pelos conteúdos postados por terceiros, imbuídas de seus superpoderes de media- ção, agiram com total discricionariedade para aplicar as medidas punitivas acima relatadas, sem franquear ao acusado qualquer possibilidade de defesa. Praticamente uma execução sumária. Mais uma vez, parece-nos perfeitamente compreensível que os atos do ex-presidente merecessem, por tamanha gravida- de, medidas incisivas dirigidas ao apaziguamento da situação, à prevenção de novos episódios, bem como a punição do próprio infrator. Tudo isso, porém, desde que observadas regras aptas à

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