Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 74-100, Set.-Dez. 2022 93 Superado esse ponto, vale ressaltar que também há proje- tos de lei em andamento que aventam a adoção de um modelo de regulação privada, por meio do qual os próprios provedores estabeleceriam regras e as aplicariam, procedendo eles mesmos à derrubada de conteúdos supostamente infringentes que, em seu entender, estivessem em desacordo com as leis brasileiras. Esse modelo seria compatível com a pretensa responsabilização de tais provedores, também pretendida por alguns dos projetos de lei acima citados. Mas, na verdade, diante de nossa moldura constitucional, que preceitua a reserva de jurisdição para qualquer lesão ou ameaça de direito, o Brasil jamais poderia adotar o modelo da autorregulação (ou regulação privada) de forma isolada. É possí- vel, todavia, aventar-se o modelo da corregulação. Mas, em nos- so ver, com temperamentos. Com efeito, caso venha a ser adotado o modelo da corre- gulação pela legislação brasileira, há que se ter em mente que ainda que o Judiciário dê a palavra final sobre a livre circula- ção de ideias e manifestações, os provedores, empresas priva- das, passarão a deter verdadeiro (e, para nós, perigoso) poder de julgamento discricionário para bloquear conteúdos, censurar de forma prévia manifestações supostamente infringentes e até banir usuários. E a considerar que atualmente as redes sociais passaram a representar o meio mais popular para criação e com- partilhamento de ideias e pensamentos, a atribuição de um su- perpoder a atores privados, proprietários de tais meios comu- nicativos e defensores de seus próprios interesses econômicos sobre um tema tão caro para qualquer democracia e, sobretudo, para a brasileira, ainda tão incipiente, deve ser algo muito bem refletido, estruturado e sistematizado, com a menor discriciona- riedade possível, para que em vez de resolvermos um problema, não criarmos tantos outros. No episódio do Capitólio narrado no Capítulo 2 deste tra- balho, em reação às manifestações de Donald Trump, acusado de incitar os manifestantes que invadiram a Casa do Congresso
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