Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 206-244, Set.-Dez. 2022  218 acaso, Delfino ressalta que a cooperação é um pilar do socialis- mo, enquanto os países capitalistas baseiam-se na competição. A colaboração teria servido à doutrina processual comunista para criar juízes Hobin-Hood’s, de vertente assistencialista, menos preocupados com a solução do litígio e mais com a realização de uma Justiça material, que, naquele contexto, era uma palavra com evidente viés marxista. Comparativamente, Castelar Pinheiro (2002) constatou, em estudo empírico sobre o tema, que, para 73,1% dos magistrados brasileiros questionados, “a busca da justiça social justifica deci- sões que violem os contratos”, de modo que “a politização das decisões judiciais frequentemente resulta da tentativa dos magis- trados de proteger a parte mais fraca na disputa que lhe é apre- sentada” (PINHEIRO, 2002, p. 41). Um aspecto negativo desta- cado pelo autor diz respeito à insegurança jurídica dos pactos, resultando em um aumento dos custos dos serviços, haja vista a transferência do risco em contratos assimétricos para a parte mais fraca, na forma de juros (Apud SOUZA, 2015). Contudo, tem-se a impressão de que os críticos confundem parcialmente o modelo cooperativo com o inquisitivo. A suges- tão é a intervenção judicial, porém de maneira horizontal. Não se pretende uma concepção filosófica subjetivista da verdade focada na razão do juiz ou em um empirismo materialista. Em fato, como se aprofundará a seguir, propõe-se o reconhecimento de uma ver- dade enquanto construção intersubjetiva das próprias partes, afi- nal, estas são as titulares dos direitos em controvérsia. Nenhuma outra poderia emergir com maior legitimidade democrática. Acerca dos perfis de magistrados e como cada um se ade- qua a um modelo de processo (e indiretamente a um modelo de Estado), François Ost (2007) descreve três tipos ideais 6 de juí- zes, classificados como Júpiter, Hércules e Hermes. O primeiro desses refere-se ao deus dos deuses, da lei e da ordem. Trata- se do juiz burocrata, aplicador da lei neutra, em observância à pirâmide de Kelsen. Este adota uma posição passiva diante do 6 O conceito de “tipo ideal” foi formulado por Max Weber designando uma abstração das principais ca- racterísticas do objeto, realçando o seu caráter em determinado sentido. É uma construção teórica e meto- dológica feita para atender ao propósito de um argumento específico. Não se pretende que seja universal e encontrada em estado puro na realidade.

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