Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 206-244, Set.-Dez. 2022 216 é o referencial para leitura do código. O neoconstitucionalismo substancializou a processualística com o direito material consti- tucional, tirando-o do burocratismo. Nesse sentido, destaca-se, dentre os preceitos éticos aplicáveis, o princípio da cooperação, elevado a eixo norteador desse ramo jurídico. O mesmo se reve- la, então, não somente através da depuração de um conjunto de regras somadas ao longo do código, mas em uma ideia geral a ser observada, a todo momento, como parte do espírito do processo. O ato de pulverizar a constituição ao longo da lei processual enriqueceu o vocabulário jurídico com uma gama de expressões que fazem questão de evidenciar a carga constitucional embutida nos institutos tradicionais, adjetivando-os. Fala-se, por exemplo, em processo democrático cooperativo (THEODORO JÚNIOR, 2018). O termo põe em destaque igualmente o princípio do Estado De- mocrático de Direito, positivado no art. 1º da CRFB, infiltrando na ciência processualística valores como a dignidade da pessoa humana e a solidariedade social. A mera análise semântica da palavra “democracia” nos remete à ideia de que o poder emana do povo e a um regime político (e jurídico) participativo, com capacidade real de influência sobre as tomadas de decisões. Outra norma maior que desce para o neoprocessualismo e se concretiza no princípio cooperativo é a igualdade material. A posição do juiz em diálogo com as partes, aplicando um Direito sujeito a ponderações valorativas, ajuda a promover uma noção de justiça social efetiva. Permite-se, assim, que o julgador seja sensível à vulnerabilidade ou hipossuficiência de um dos liti- gantes, dando-lhe tratamento mais benéfico e privilegiando uma solução moralmente justa, ainda que, por vezes, menos técnica. Entretanto, nem tudo são vantagens no recente modelo. A nova feição da atividade de jurisdição fortaleceu inegavelmente os poderes do Judiciário. Isso tem seu aspecto positivo e negati- vo. Os críticos do neoconstitucionalismo costumam se preocupar com o aumento abusivo da discricionariedade judicial, capaz de alçar o magistrado quase à posição de legislador. Explica-se que o movimento propicia ao órgão jurisdicional a própria criação de
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