Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 206-244, Set.-Dez. 2022  215 do pensamento jurídico constituiu-se a partir da segunda meta- de do século XX, tendo como marco, no Brasil, a promulgação da Constituição de 1988, através do fenômeno que se convencionou chamar de neoconstitucionalismo . Apesar de haver muito dissenso a respeito das características determinantes desse momento, bem como críticas à terminologia 3 , basicamente, por ele, entende-se que a Carta Magna é dotada de força normativa imediata, capaz de subjugar a aplicação de todo o ordenamento jurídico aos seus ditames, bem como impor deveres e direitos, muitas das vezes, sem necessidade de intermediação legislativa (DIDIER JR., 2011). O resultado dessa forma de encarar o Direito contemporâ- neo é que a Constituição, antes vista quase como uma carta de intenções, de eficácia praticamente retórica, passou a irradiar o seu conteúdo valorativo pelo Direito como um todo, tornando a interpretação jurídica uma tarefa mais profunda e sujeita a apro- priações ideológicas. Nesse contexto, interpretar o Direito torna- se uma atividade multidisciplinar e crítica, pois implica inquirir a respeito do propósito do constituinte e dos ideais magnos da sociedade, sendo inevitável algum nível de politização. Por esse efeito de animar o Direito com uma carga axioló- gica, denominou-se essa fase também de pós-positivismo , tendo rompido com a adoção do texto duro da lei e estabelecido um conteúdo ético mínimo a ser observado. Portanto, uma das mar- cas desse modelo é o fortalecimento dos princípios constitucio- nais, que, apesar de serem normas gerais e abstratas, ganharam força cogente autônoma, expandindo e consagrando também os direitos fundamentais, agora sob a guarida direta do Poder Judi- ciário (DIDIER JR., 2011). No que diz respeito à vertente desse fenômeno direcionada especificamente ao DIREITO PROCESSUAL CIVIL, chamou-se de neoprocessualismo ou ainda de formalismo-valorativo 4 tal infusão de valores essenciais na teoria do processo. O próprio CPC preo- cupou-se em deixar claro, logo em seu art. 1º, que a Constituição 3 Segundo Didier Jr. (2015), o termo peca por ser demasiadamente vago, e, por isso mesmo, há autores que defendem existir vários “neoconstitucionalismos”. 4 Termo capitaneado por Carlos Alberto Alvaro de Oliveira (2006).

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