Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 206-244, Set.-Dez. 2022 213 valores constitucionais de solidariedade social e dignidade da pessoa humana. São eles a eticidade , a socialidade e a operabilidade . Os dois primeiros, sobretudo, dizem respeito à dimensão ética e social das relações privadas, especialmente no que tange à boa- fé objetiva e à função social. Junto a estes valores, estão, dentre outros, os subprincípios da força obrigatória dos contratos ( pacta sunt servanda ) e da preservação dos negócios jurídicos. Não só a propriedade, mas as relações privadas, de um modo geral, aten- dem a uma função social, interessando ao bem-estar coletivo. Nesse sentido, a boa-fé objetiva demanda o cumprimento do de- ver anexo de cooperação, mesmo fora da relação processual, de modo que os particulares têm o compromisso ético de zelar para que as expectativas mútuas não sejam frustradas. Nessa linha, destacam-se ainda o dever de não causar dano a outrem, ainda que no exercício do seu direito, quando este ultrapassar os limi- tes da finalidade social, econômica, da boa-fé ou dos bons costu- mes, constituindo abuso de direito (art. 187 do CC), bem como o dever de mitigação das perdas ( duty to mitigate the loss 2 ), por meio do qual a parte detentora de um crédito não deve adotar comportamento que agrave sua condição, gerando ônus desne- cessário para a adversa. Em complementação, o valor da opera- bilidade, que animou o código material pretendeu dar simplici- dade à aplicação do Direito por meio de um sistema aberto de cláusulas gerais, o que permite a adequação das normas através de uma interpretação jurídica sistêmica no sentido de conferir maior efetividade aos mandamentos constitucionais. Por essa perspectiva, também o diploma material é per- meado por regras e princípios que visam a imprimir uma maior solidariedade e eticidade nas relações privadas. Assim, rompe-se a concepção de uma ética liberal puramente negativa (não violar o direito do outro) para dar lugar a uma ética positiva, pauta- da na alteridade (respeitar reciprocamente o direito do outro). O modelo cooperativo do CPC parece estar em harmonia com essa tendência. Não se nega que a motivação dos sujeitos pro- 2 Enunciado nº 169 do CJF/STJ na III Jornada de Direito Civil “O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo”.
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