Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 206-244, Set.-Dez. 2022 208 colocou o ministro Marco Aurélio de Melo, em breve passagem que se destaca: Apressão que advém desse antagonismo põe a nu o que pode ser considerado, aos olhos da população, o tendão de Aquiles, a maior fragilidade do sistema jurídico brasileiro – a morosi- dade na entrega da prestação jurisdicional, cujas consequên- cias, infelizmente, são o desalento de quem a requer e o des- crédito para aqueles que, mesmo ungidos de toda abnegação, veem-se impotentes para debelar a avalancha cotidiana de processos. Os perigos de tais posturas, Kafka outrora bem os revelou ao enunciar, no magistral “O processo”, que a Justiça existe para quem nela acredita. Destarte, a perda dos valores simbólicos, carcomidos pelas algemas da lentidão, inevitavel- mente acabará resultando na prevalência da lei do mais forte, na exacerbação do poder econômico, acabrunhando sempre e mais o desvalido cidadão comum. (MELLO, 2007, pp. 88-90) Assim, por trás do intuito da legislação em flexibilizar as normas processuais e solucionar crises jurídicas por conciliação, está a imperatividade de atender às demandas contemporâneas por jurisdição. É perceptível, já há algum tempo, que o processo contencioso, burocrático e preocupado em impor a vitória de uma parte sobre a outra, muitas vezes não é eficiente o bastante, tanto para pacificar o conflito já existente quanto para prevenir o surgi- mento de novos conflitos no seio das relações sociais conturbadas. Mas, para além da necessidade prática de responder a um sistema lento e formalista, há uma preocupação de ordem ideo- lógica levando autores a defender a existência de uma mudança paradigmática em curso, que deverá levar a uma nova cultura no método de solução de crises jurídicas. Começam a soar expres- sões como processo colaborativo ou processo democrático . Termos praticamente antitéticos, parecem absurdos a um primeiro olhar conservador. Se o processo sempre foi caracterizado por uma lide e por um desenvolvimento dialético da verdade centrado no convencimento do magistrado, falar em cooperação no con- flito, ou democracia na sentença, aparenta ser uma excrecência. Contudo, é exatamente uma superação dos perfis adversarial e
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