Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

182  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 168-195, Set.-Dez. 2022  da realidade psicológica, biológica, econômica ou sociológica da autonomia infantil e da dependência das crianças em relação aos adultos. Logo, não se deve ocultar a reflexão sobre a infância e a juventude como categorias ou condições sociais. Afirma tam- bém que o discurso autonomizante teria gerado uma ruptura de alto para baixo, baseada na demonização do passado ou na ideia de que a criança era considerada até a Convenção como um ser inferior, um não sujeito, ou um objeto, passando então a ser con- cebida como sujeito de direitos, porém sem deveres ou sem res- ponsabilidades. O foco, portanto, não deveria estar em um fim político, de observar a criança como cidadã, mas de reconhecer o risco do paternalismo e de dar à criança meios de defesa contra aqueles que têm o poder de exercer por ela seus direitos. É trazer um conjunto de modificações e reformas que não contrariem a lógica protetora, mas que permita prevenir e sancionar os casos em que essa proteção se transforma em abuso de poder 23 . Prossegue a autora ao dizer que o fundamento político não deveria ser o de emancipar a criança em razão de uma suposta opressão do adulto, mas o de reconhecer que todas as crianças são dependentes e que algumas são vítimas dos pais, da socie- dade ou do Estado, de forma a evitar o que ela denomina de pseudojuridicismo psicossocial , caracterizado por um paternalismo pós-moderno em que o Estado, em substituição da família, de- tém a palavra final sobre o que é o melhor interesse da crian- ça, ocupando um espaço autoritário na aplicação de direitos, o que contradiz a lógica dos direitos humanos. O Poder Judiciário, como instrumental estatal, tornar-se-ia uma máquina burocráti- ca monstruosa com perda da nitidez das fronteiras com o traba- lho social, criando impasses de políticas públicas e exacerbando os riscos de controle social estatal com redução do papel e do escopo da atividade jurisdicional como garantidor de direitos 24 . Por fim, Théry chama a atenção para a necessidade de ob- servar o pluralismo das relações sociais e dos diversos tipos de in- 23 THÉRY, Irène. Novos direitos da criança – a poção mágica? In ALTOÉ, Sônia (Org.). A Lei e as leis. Direito e Psicanálise. Rio de Janeiro: Revinter, 2007. p. 144-150. 24 Ibid . p. 151-157.

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