Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

181  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 168-195, Set.-Dez. 2022  Não se desconsidera a grande evolução que esse tratado ge- rou para os direitos dos infantes, particularmente ao trazer à tona a doutrina da proteção integral, mas o seu debate foi permeado por grandes disputas de caráter ideológico entre os que professavam a necessidade de proteção, já evidenciada nas Declarações de 1924 e 1959, e aqueles que demandavam a necessidade de caracteriza- ção da criança como sujeito de direitos. A Convenção, entretanto, acabou adotando as duas posições, gerando várias críticas a quem considera que os direitos de proteção contrastam com aqueles que concedem liberdades ao público infantojuvenil 21 . Ressalte-se que direitos de proteção são aqueles que visam a resguardar a criança e o adolescente face à sua condição pecu- liar de desenvolvimento e à sua vulnerabilidade em relação aos adultos. Já os direitos de emancipação dizem respeito àqueles cujo objetivo é tornar o infante um indivíduo pleno e respeitado, rumo à sua maioridade. Para Irene Théry, esses dois pontos de vista possuem sen- tidos não só diferentes, como contraditórios, vinculados a duas tradições antagônicas. A tradição da proteção reconhece as es- pecificidades da infância e sua condição de vulnerabilidade. Já os partidários da autodeterminação afirmam que a proteção da infância é uma forma moderna de opressão secular, pois os filhos seriam projetos de seres humanos, sendo-lhes negado o pertenci- mento à comunidade. Assim, o texto da Convenção não proporia solução para essa contradição, gerando ambiguidades teóricas, porquanto a pessoa é criança naquilo que não se diferencia do adulto e está sujeita à responsabilidade parental, razão pela qual a concessão de direitos de liberdade às crianças e aos adolescen- tes estaria descontextualizada da realidade social e familiar, não podendo haver tratamento igual ao do adulto 22 . Ainda para Théry, a infância deve ser pensada como in- fância, uma humanidade em devir, não podendo ser afastada 21 Ibid . p. 48-49. O debate também foi permeado pela discussão entre países capitalistas e socialistas no contexto da Guerra Fria, em que os primeiros ensejavam a discussão de direitos civis e políticos, enquanto os segundos demandavam a pactuação de direitos econômicos, sociais e culturais. 22 THÉRY, Irène. Novos direitos da criança – a poção mágica? In ALTOÉ, Sônia (Org.). A Lei e as leis. Direito e Psicanálise. Rio de Janeiro: Revinter, 2007. p. 138-142.

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