Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022
170 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 168-195, Set.-Dez. 2022 Todavia, é notória a dificuldade dos operadores do Direito e da praxe judiciária e institucional em abandonar certas práti- cas ainda ligadas à concepção menorista da doutrina da situação irregular, permeando o debate jurídico em torno de ideias não mais respaldadas pela ordem constitucional e internacional. Por- tanto, embora tenha ocorrido avanço na pauta dos direitos da criança e do adolescente, como, por exemplo, o reconhecimen- to da condição de sujeitos de direitos, ainda paira, no sistema jurídico-estatal, os ares do paternalismo e do assistencialismo da doutrina que consagrou o Código de Menores de 1979. É interessante notar como a legislação caminhou do ampa- ro somente a crianças vulneráveis e da regulação de adolescentes em conflito com a lei para a garantia de direitos a todas as crian- ças e adolescentes, sem distinção. Por outro lado, ao se consa- grar atualmente a condição de sujeitos de direitos, com respeito à autonomia do público infanto-juvenil, não se afastou a ideia de proteção relativa à própria condição peculiar de desenvolvimen- to. Evidencia-se, assim, a ocorrência de uma certa ambiguidade ou oposição entre direitos de proteção e de emancipação, pois, se de um lado protege-se a criança e o adolescente ante sua ima- turidade, do outro concede-se a eles espaços de autonomia e de liberdade como direitos fundamentais. A hipótese deste artigo é de que essa ambivalência entre proteção e autodeterminação precisa ser mais discutida no âm- bito jurídico à luz das outras ciências humanas e sociais em um debate interdisciplinar, de modo que todas se influenciem mutu- amente, rechaçando-se concepções paternalistas ou assistencia- listas ainda em voga. Para tanto, utiliza-se o aporte teórico dos fundamentos dos direitos humanos, observada a ligação intrín- seca entre estes e os direitos da criança e do adolescente. Outrossim, não se pode olvidar que há pouca ou nenhuma contextualização social dos temas ligados à criança e ao adoles- cente no campo do Direito, em função da extrema abstração das normas jurídicas e da lenta operacionalização das mudanças de paradigmas culturais e sociais, levadas a cabo pela constitucio-
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