Revista da EMERJ - V. 24 - n.3 - Maio/Agosto - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 101-118, Set.-Dez. 2022  103 É forçoso reconhecer que o amicus curiae tem particularida- des próprias que o diferenciam sensivelmente do terceiro tradicio- nal 5 , como o assistente (simples ou litisconsorcial), este um auxiliar da parte com interesse jurídico e próprio na ação – citando-se como exemplo o sublocatário, que tem interesse próprio na improcedên- cia da ação de despejo movida em face do locatário. O interesse do amicus curiae na prevalência de uma das teses será sempre institu- cional – como pode ocorrer quando a Ordem dos Advogados do Brasil ingressa no feito como amicus curiae na defesa das prerrogati- vas do advogado, e não do interesse pessoal do advogado. 6 Nos termos do artigo 138 do CPC, a pessoa natural ou ju- rídica apta a intervir como amicus curiae deve ser capaz de con- tribuir tecnicamente com a solução do conflito, somando argu- mentos, dados técnicos e teses relevantes para a elucidação da controvérsia, e sempre orientada, como visto, pelo interesse pu- ramente institucional, ideológico, altruístico e nunca interesse jurí- dico pessoal, próprio . Ainda que a matéria em julgamento apresen- te relevância, especificidade ou maior repercussão social, não se pode permitir a intervenção, nessa condição,daquele que possui interesse jurídico na demanda como se parte fosse 7 . 5 “A intervenção como amicus curiae não é intervenção de terceiro, apesar do substantivo usado nos §§ 1º e 2º do art. 138, e já que o amicus curiae não fica sujeito ao julgamento proferido no processo a que comparece, salvo naqueles em que a coisa julgada se estende às pessoas que não integram o feito, naqueles casos em que essa consequência opera”. (BERMUDES, Sérgio. CPC de 2015: inovações. 1ª ed., Rio de Janeiro, LMJ Mundo Jurídico, 2016, p.111). 6 “O CPC/2015 acabou por disciplinar expressamente a intervenção do AC como modalidade diferenciada de tercei- ros, generalizando-a, em contraposição às específicas previsões que, até então, encontravam-se dispersas no sistema processual civil”. (BUENO, Cassio Scarpinella. Comentários ao código de processo civil - volume 1 (arts. 1º a 317) / Cassio Scarpinella Bueno (coordenador) - São Paulo: Saraiva, 2017, p. 601/602). 7 Para Antonio do Passo Cabral, “O amicus curiae , uma vez admitida sua manifestação, não se agrega à relação processual, porque seu interesse no litígio é decorrente do direito à participação no processo. Não há interesse em integrar a relação processual, vez que o título executivo que porventura seja formado não incluirá o amigo da Corte, pelo que, neste particular, seu interesse é reflexo ou mediato. Por outro lado, o interveniente típico deve demonstrar seu interesse jurídico na demanda ( rechtliches interesse ), ou seja, imperativo é que se comprove a influência que o deslinde do processo poderá ter sobre uma relação jurídica do interveniente ( Rechtsbeziehung begründetes inte- resse ). Se este alega ser titular de relação jurídica de direito material incompatível com aquela que será afirmada caso uma das partes seja vencedora, haverá interesse jurídico para a intervenção. Não cabe um mero interesse econômico ou afetivo, tampouco a intenção de esclarecer matéria de fato ou de direito. O amicus curiae não precisa demonstrar interesse jurídico. Sua atuação decorre da compreensão do relevante interesse público na jurisdição e da busca de per- mitir a participação política por meio do processo. A importância de sua intervenção é política e seu interesse é ideo- lógico, de exercer parcela de participação manifestando-se nos autos. Situação semelhante ocorre com a legitimação do denominado ‘ ideological plaintiff ’ na litigância coletiva das ‘ class actions ’ nos EUA, em que a parte não porta interesse jurídico, mas uma conexão ideológica com um interesse da comunidade, o que representa forma de participa- ção processual que é sustentada e incentivada por autores como Mauro Cappelletti e Vicenzo Vigoritti”. (CABRAL, Antônio do Passo. Pelas asas de Hermes: a intervenção do amicus curiae , um terceiro especial. Uma análise dos institutos interventivos similares - o amicus e o vertreter des öffentlichen interesses. Revista de Processo,

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