Revista da EMERJ - V. 24 - N. 2 - Maio/Agosto - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, p. 41-68, Mai.-Ago. 2022  59 so ou da transação penal na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha. O instituto da suspensão condicional do processo se popu- larizou com o advento da Lei nº 9.099/95 – a Lei dos Juizados Es- peciais –, se aplicando aos chamados “delitos de menor potencial ofensivo”. E o não cabimento desse instituto em casos que versam sobre violência doméstica e familiar contra a mulher se justifica pelo fato de que o art. 41, da Lei nº 11.343/06 proíbe a aplicação da Lei dos Juizados Especiais nesse âmbito. Isso significa dizer que a Lei Maria da Penha visa a erradicar uma violência grave. Contrariando a tendência patriarcal de tratar essa violência como algo menor, ou suas vítimas como dignas de um cuidado especial por parte do Estado, a Lei Maria da Penha se qualifica como uma proposta que reconhece a particularidade desse tipo de violência, na medida em que permite defini-la como grave. Na explicação de Valéria Pandjiarjian, “a natureza específica da relação interpessoal entre vítima e agressor (...) majora (e não minora) o potencial ofensivo dos crimes cometidos contra as mulheres no âmbito da violência doméstica e familiar” 28 . A esse entendimento, porém, não se segue uma conclusão punitivista, mas o reconhecimento de que ela não pode ser analisada da mes- ma forma como as outras. Uma leitura de gênero dessa realidade pode destacar a ne- cessidade de se encontrar alternativas para contornar a condi- ção de vulnerabilidade das mulheres, saída esta que, entende-se aqui, não precisa ser um uso mais rigoroso do poder punitivo do Estado, mas a criação de mecanismos que evitem a reiteração da prática delitiva. Com efeito, como ressalta Adriana Mello a respeito da Lei Maria da Penha, “[e]sta lei reforçou a abordagem feminista da criminalização e propôs, em simultâneo, um trata- mento multidisciplinar, estabelecendo medidas protetivas – além das criminais – para o enfrentamento da violência doméstica” 29 . 28 PANDJIARJIAN, Valéria. Balanço de 25 anos da legislação sobre a violência contra as mulheres no Brasil. In: DINIZ, Simone G; SILVEIRA, Lenira P.; LIZ, MirianA. (Org.). Vinte e cinco anos de respostas brasileiras em vio- lência contra a mulher (1980-2005): Alcances e limites. São Paulo: Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, 2006. 29 MELLO, Adriana Ramos de. Feminicídio: uma análise sociojurídica da violência contra a mulher no Brasil. Rio de Janeiro: LMJ Mundo jurídico, 2017.

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