Revista da EMERJ - V. 24 - N. 2 - Maio/Agosto - 2022
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, p. 164-186, Mai.-Ago. 2022 176 Tanto neste como naquele caso, dúvidas quanto à impar- cialidade do órgão julgador seriam suscitadas, bem como os tri- bunais estariam sujeitos a pressões políticas, que tenderiam a se acentuar em proporção direta ao montante em discussão 17 , es- pecialmente no caso do Poder Judiciário do país autor do ilícito, diante da repercussão de eventual condenação em suas próprias contas públicas. Caso o investidor buscasse o Judiciário de seu próprio país, haveria, ainda, dificuldade adicional: a imunidade de jurisdição, a qual impede o exercício da atividade jurisdicional por um Esta- do sobre atos de império de outro 18 . O Brasil, seguindo entendi- mento predominante no Direito Internacional, confere natureza absoluta à imunidade de jurisdição 19 , salvo renúncia expressa do Estado, seja no caso posto em juízo, seja por meio de instrumento de Direito Internacional. Além de costume internacional, a imunidade de jurisdição encontra previsão em diversos tratados internacionais, como a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, internalizada no Brasil pelo Decreto nº 56.435 de 1965. Como regra, atos esta- tais lesivos aos interesses de investidores estrangeiros são, justa- 17 GIUSTI, Gilberto; TRINDADE, Adriano Drummond Cançado. As arbitragens internacionais relaciona- das a investimentos: a Convenção de Washington, o ICSID e a posição do Brasil. In : Revista de Arbitragem e Mediação, vol. 7, p. 50-51, out./dez. 2005. Em idêntico sentido, Leonardo de Campos Melo relata o caso do Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais. Em 1943, o governo de Minas Gerais, sob a alegação de que a França – a instituição financeira foi fundada com capital francês – se encontrava ocupada pelos nazistas, expropriou as ações do banco. A última decisão judicial a respeito do caso foi proferida em 18.03.2002, quando do julgamento do RE 38.644, rel. min. Néri da Silveira, sendo certo que a indenização somente foi paga aos investidores estrangeiros na década de 1970 (MELO, Leonardo de Campos. Introdução às arbitragens de investimentos perante o Sistema ICSID. In : Revista de Arbitragem e Mediação, vol. 34, p. 56, jul./set. 2012). 18 Nas palavras de Celso Duvivier Albuquerque Mello, ao comentar a imunidade de jurisdição: “[a] grande tendência nos dias de hoje é a de se distinguir entre os atos praticados pelo Estado ‘jure imperii’ e os atos ‘jure gestionis’. Esta distinção surge nos tratados de paz após a Iª Guerra Mundial, mas a sua primeira consagração em um tratado multilateral foi no citado Código Bustamante. Os primeiros goza- riam d e imunidade, o que não aconteceria com os segundos. Esta restrição à imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro se originou no fato de que os Estados se dedicam cada vez mais a atividades co- merciais (“jure gestionis”). Os atos “jure imperii” podem ser considerados (Lalive) os seguintes: a) atos legislativos; b) atos concernentes à atividade diplomática; c) os relativos às forças armadas; d) atos da administração interna dos Estados; e) empréstimos públicos contraídos no estrangeiro.” (MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público . 1º Vol. 12º ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 429). 19 A título de exemplo, ACO 543 AgR, Relator(a): min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2006, DJ 24-11-2006 PP-00061 EMENT VOL-02257-01 PP-00044 RDDT nº 138, 2007, p. 135-150.
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