Revista da EMERJ - V. 24 - N. 2 - Maio/Agosto - 2022
150 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, p. 143-163, Mai.-Ago. 2022 que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista violação de um dever jurídico espe- cífico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais, ou quando for de conhecimento do Poder Público eventuais irregularida- des praticadas pelo particular.” Desse modo, em lugar de apegar-se à teoria da culpa anôni- ma para casos de dever genérico, implicando uma dualidade de teorias para a omissão, como pretendia a corrente intermediária, melhor ficou a questão ao prender-se a jurisprudência à questão do dano específico no caso concreto, até porque a teoria da cul- pa anônima constitui fase intermediária de evolução da teoria da culpa para a teoria do risco. 17 A mesma evolução jurisprudencial se deu na definição do tema 362, em setembro de 2020, quando o STF decidiu que a simples fuga de detento não implica responsa- bilidade do Estado por crime por ele praticado se a conduta ocorre após a consolidação dessa fuga, afastando o nexo de causalidade. Portanto, o conjunto de decisões permite concluir que ha- verá dever de indenizar por parte do Estado quando houver: a) dano; b) dever de agir por parte do Estado; c) conduta omissi- va; d) nexo de causalidade. Admite-se o rompimento do nexo de causalidade pela conduta de terceiros, da própria vítima ou por força maior, como consagrado na teoria do risco administrativo, ressalvando-se a possibilidade de somatório de causas. 4. Antes de passar à aplicabilidade prática desse enten- dimento jurisprudencial, é preciso compreender o que de fato ocorreu nessa uniformização de compreensão, tendo por objeto a construção normativa que se deu a partir do dispositivo cons- titucional analisado. Ao examinar historicamente a forma como o constituinte originário construiu o dispositivo do art. 37, § 6º, da Constituição de 1988, percebe-se que o texto normativo não difere muito daquele previsto também no art. 194 da Constitui- 17 O que não significa a completa ausência de hipóteses de responsabilização da Administração Pública por culpa, como ocorre no caso de imputação de erro médico, e não mera falha do sistema de saúde, ou em casos de responsabilidade contratual subsidiária ou solidária.
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