Revista da EMERJ - V. 24 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 71-94, Jan.-Abr. 2022  87 família para os tribunais, os quais são legalmente instruídos a imiscuir-se e opinar na dinâmica familiar, atravessando suas re- lações internas, intrínsecas. Nesse sentido, “é possível reconhecer as significativas in- terferências que o Poder Judiciário pode realizar nas relações fa- miliares” (OLIVEN, 2011, op. cit.), não apenas fiscalizando, mas arbitrando sobre as leis que estabelecem normativas acerca dos cuidados e responsabilidades que as famílias devam ter com re- lação aos seus membros. Para além dessas funções, ele executa também o papel de implementador de políticas para a condu- ção da difícil tarefa de promover mudanças de mentalidades (CHAUÍ, 2011). Suas leis, quando não devidamente cumpridas, acarretam sanções que podem alterar toda uma conjuntura fa- miliar e causar sérias repercussões – inclusive determinando a destituição do poder familiar 8 . A judicialização de ações cotidianas evidencia o recrudes- cimento de um processo que se convencionou chamar de cida- danização , no qual, quanto mais se avança em direção ao apri- moramento das instituições democráticas, menos autonomia se obtém. De fato, tal termo é utilizado para se referir à conversão e disciplinarização do elemen- to popular à racionalidade e à ordem vigente. Para tanto, configuram-se instituições e agentes comprometidos com a homogeneização da sociedade através da expansão de uma determinada visão de cidadania (CORREIA, 2010, pp. 13-14). Nessa condição, os direitos (civis, políticos e sociais) que permitem ascender à condição de cidadão não se encontram co- adunados – o acesso a um não garantindo o alcance automático aos demais. Além disso, a obtenção de tais direitos se dá por interesse do Estado, o que possibilita a este formatá-los de acordo com seus critérios e interesses. 8 Art. 24. Aperda e a suspensão do pátrio poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustifi- cado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22 (BRASIL, 1990, op. cit.).

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