Revista da EMERJ - V. 24 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2022
180 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 166-189, Jan.-Abr. 2022 nada competência constituinte reformadora 17 (cláusulas pétreas), podem ser efetivamente interpretados em termos absolutos (e à luz da simples literalidade 18 ), considerando que todas as previ- sões constitucionais outorgantes de garantias individuais, sem qualquer exceção, necessariamente se constituem, no âmbito das sociedades contemporâneas, em autênticos direitos-condição. Vale lembrar que o pacto social que idealizou a sociedade em seu grau de maior complexidade (organizada em um Esta- do), concebeu paralelamente a ideia jurídica da prevalência do coletivo sobre o individual ou grupal, forjando, dessa forma, a ideia da relativização dos direitos de cada indivíduo, criando verdadeiras condições (ou deveres associados) para o seu efe- tivo exercício. Assim, o direito individual à vida está umbili- calmente condicionado, por exemplo, à ausência de ameaça à vida alheia (considerando o instituto da legítima defesa), bem como o direito à liberdade condiciona-se, por seu turno, à ine- xistência de prática de qualquer delito com previsão de pena privativa de liberdade. Se o destinatário do direito à vida associado à razão preser- vativa do bem tutelado converge para a senciência , como caracte- rística basilar dos seres humanos, é lícito concluir que o homem não somente possui o direito à vida, como também à dignidade relativamente a ela, uma vez que não teria qualquer sentido – quer jurídico, político ou mesmo filosófico – o ser humano ser prisioneiro de uma autêntica escravidão corpórea ou, em outros termos, ser um manipulável objeto de uma condenação (sem prazo definido) a uma existência sem sentido que, por sua vez, acabaria por, simplesmente, extinguir o correlato direito à liber- dade, excluindo, por via de consequência, a característica funda- mental e intrínseca do livre-arbítrio. 17 É conveniente destacar que, tecnicamente, não é correto a expressão “Poder Constituinte Derivado Reformador (ou de 2º Grau)”, posto que o único e verdadeiro Poder Constituinte é o originário (ou de 1º Grau), sendo certo que deste emana tão somente uma competência derivada de índole reformadora. 18 Não é possível interpretar literalmente a lei, posto que, em sendo o legislador um leigo emmatéria técni- co-jurídica, deve-se sempre perquirir a correta hermenêutica normativa, que necessariamente transcende a simples redação textual para adentrar em aspectos lógico-racionais como a mens legislatori, a mens legis, o occasio legis e argumentos como o a contrario sens u e o a fortiori , além de considerar a posição sistemática, histórica, e teleológica do dispositivo legal sub examen.
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