Revista da EMERJ - V. 24 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2022
168 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 166-189, Jan.-Abr. 2022 já que nenhum direito o é. E, ainda, que a vida pertence a cada um de nós e que o livre-arbítrio nos permite, sim, dispor da pró- pria vida. Para dinamizar a exposição do tema e debatê-lo de maneira organizada e com mais profundidade, optou-se por dividir este artigo em quatro partes: na primeira, discute-se a raiz teológica do problema, isto é, os atavismos teocráticos que não permitem, em vários espaços públicos, sequer debater assuntos considera- dos da “ordem do sagrado”, e a morte é um deles. Na segunda parte, são estabelecidas relações entre o direito à vida e o direito à morte e as implicações entre o direito e a moral e suas correlações com as esferas pública e privada. Em seguida, aprofundam-se questões jurídicas atinentes ao direito à vida, como bem tutelado que é, para concluir que o homem não somente possui o direito à vida, como também à dignidade relativa a ela, sob pena de fazer suplantar o correlato direito à liberdade. Por fim, na última parte, discute-se o direito à morte assistida e as consequências jurídicas dela decorrentes, tal como a previsão contida no Código Penal de 1940, cujo artigo 122 estabelece pena de dois a seis anos para quem “induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça”. Mas mesmo assim, o Conselho Federal de Medicina publicou, em 2012, a Resolução CFM nº 1.995/2012, que permite ao paciente manifestar-se previamente sobre os cui- dados que deseja receber ou não quando estiver incapacitado de expressar a sua vontade. O fecho do artigo não significa obviamente o fim do debate, mas uma pausa, antes de encadear discussões de outros aspectos inerentes ao tema e que a pesquisa irá apontar. 1. ATAVISMOS TEOCRÁTICOS Como diz Rabelo (2006), a história, como tecido cultu- ral, ocupa importante papel na compreensão da expressão do “ser-no-mundo” diante do fenômeno da morte. A autora vê o passado como testemunha do vivido que, recuperado pela his- toriografia, permite revelar nas diferentes épocas o modo pelo
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