Revista da EMERJ - V. 24 - N. 1 - Janeiro/Abril - 2022

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 144-165, Jan.-Abr. 2022  150 futuro é turvo e nebuloso. Não há visto, permissão ou diálogo. É uma tentativa desesperada que mais se assemelha a uma roleta russa. Famílias inteiras lançam a sorte ao mar e sonham com o éden no mundo desenvolvido. Milhares naufragam na travessia. Nessa toada, torna-se notória a violação aos direitos huma- nos, em especial ao princípio da dignidade da pessoa humana, o qual visa à proteção à vida, e não ao sofrimento sentido por mui- tos refugiados até chegar ao seu lugar almejado – isto é, quan- do conseguem. Pode-se dizer que é presente uma escancarada coisificação do homem, conceito este muito discutido por Marx (1996), haja vista que o ser humano, para além de suas ações, é em si um ser de valor moral, e não uma coisa. Segundo Kant, [...] o homem não é uma coisa; não é, portanto, um objeto pas- sível de ser utilizado como simples meio, mas, pelo contrário, deve ser considerado sempre em todas as suas ações como fim em si mesmo. Não posso, pois, dispor do homem em mi- nha pessoa para o mutilar, degradar ou matar (2004, p. 60). Levando-se em consideração o imperativo categórico kan- tiano, sabe-se que a razão humana é uma razão legisladora que elabora normas universais, uma vez que constitui um predicado universal dos homens, em que um ato só pode ser considerado moral quando praticado de forma autônoma, consciente e por dever. Esse imperativo moral advém da responsabilidade histó- rica pelo legado negativo do colonialismo. Destarte, trazendo a questão dos refugiados à tona, pode-se dizer que não é possível eximir-se dessa responsabilidade moral quando as vítimas de tais ações acorrem às fronteiras. Para Kant (2004), a liberdade é a condição da lei moral, o que equivale a dizer que só pode ser considerada uma ação moral aquela realizada de forma livre e autônoma. Sem liberdade, não há ação verdadeiramente moral. Contudo, a finalização do prin- cípio da dignidade da pessoa humana é a proteção na íntegra dos sujeitos de direito, a fim de garantir os direitos fundamentais, sendo dever fundamental do Estado combater a prática de vio- lações à liberdade e à dignidade dos cidadãos, o que percebe-se

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz