Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 62-94, Set.-Dez. 2021 88 do precedente deve ser compatível com a sua finalidade. Não há como admitir a adoção de um precedente quando é incom- patível com a sua finalidade ou com as razões que justificaram a sua instituição. Todavia tal incompatibilidade também pode se dar diante de razões que estão à base de uma situação nova, não tratada no precedente, que impõem a limitação do alcance do precedente e, assim, em termos concretos, a sua não aplicação ao caso sob julgamento” 31 . Exatamente o que acontece quando a jurisdição do Estado Constitucional concretiza a norma do caso e arbitra o dano indenizável – daí considerando esse “termo para frente” como marco da indexação: a atualização monetária co- meça a contar desde a data da decisão, em especial, os juros mo- ratórios fluem a partir do trânsito em julgado. O arbitramento do dano extrapatrimonial indenizável con- siste em uma faceta de ativismo judicial. Coetâneo a tal implica- ção está a autorrestrição dessa indenização para não extrapolar as funções compensatória e dissuasória dessa reconstrução 32 . Na medida em que o julgador avalia critérios que firmam patamares para o achado do montante a ser reparado, também é intuitivo que a decisão considera um valor calculado na data em que ela- borado o raciocínio. Em outras palavras, o magistrado não re- torna à data do fato para resolver a indenização como se nada tivesse acontecido – o grau de reprovação do fato lesivo 33 está 31 Marinoni, Precedentes ..., cit., p. 231. 32 “Adelimitação da ratio decidendi será realizada pelos julgados posteriores, atuando aquele julgado origi- nal como um parâmetro inicial do texto a ser interpretado. Ou seja, há um trabalho conjunto tanto da Corte competente para estabelecer o precedente como dos demais julgados que vão interpretar aquele texto e incorporar novos elementos à ratio decidendi ”. Vale dizer que o precedente originário é paulatinamente firmado com a ajuda dos julgados posteriores e por vezes dissonantes. Amudança de entendimento sobre a função jurisdicional – de uma predição conceitual a uma predição concretizadora da norma do caso – acarreta efeitos para uma distinção ampliativa ou restritiva do precedente. PEIXOTO, Ravi. A técnica da distinção ( distinguishing ) e o CPC/2015. In: ALVIM, Thereza et ali . O novo Código de Processo Civil brasileiro (estudos dirigidos: sistematização e procedimentos). Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 648. A tarefa não é fácil e depende de um verdadeiro arranjo de derivações. “A statute may have an interpretation section which provides general definitions or elucidations of the rule. However, doubts about interpretation very commonly arise with reference to some particular event or case that may allegedly have occurred or may be hypothetical. In such contexts, it is not always easy to distinguish between interpreting a rule (general) and applying it to the facts of the case (particular). TWINING, William; MIERS, David. How to do thing with rules . London: Cox & Wyman Ltd, 1976, p. 85. 33 Uma distinção clássica efetuada pelos penalistas é que o “grau de reprovação” da conduta não está na própria conduta, mas é fruto de uma valoração raciocinada pelo juiz. O objeto da valoração (os pressupostos da indenização) é diferente da valoração do objeto. No cálculo da pena criminal, ao asseverar que o juízo de reprovação não está na cabeça do autor do fato criminoso , antes, é produto de uma valoração que está na
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