Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 62-94, Set.-Dez. 2021  78 vista que esse estado é particular ou de imprecisa definição abso- luta (a tutela é híbrida). Em segundo lugar, porque a indenização por dano extrapatrimonial tem função reparatória e também pedagó- gica , sendo que a fixação dessa espécie de indenização é pautada por critérios jurídicos extraídos do sistema (dogmática) e do caso concreto, mas analisados por intermédio de um método bifásico elaborado pelo próprio magistrado. A tese jurídica da Súmula 54 do STJ repercute a dicotomia entre atos contrários ao direito: quando já existe um termo deter- minado (art. 397 do CC, vencimento ex re ) para a incidência dos juros ou quando esse termo inicial dos juros é inexistente (venci- mento ad personae ). A legislação constitui o sujeito em mora ex re (art. 398 do CC) pela prática do ilícito, quando da prática de um ato contrário ao direito extracontratual. A separação é conceitual e funcionalmente válida para separar a dicotomia do contrato ou ilícito absoluto – mas a diferença não tem sustentabilidade para conferir uma plena satisfação do dano extrapatrimonial. A nova feição da separação dos poderes desde o constitu- cionalismo reflete a primazia da jurisdição sobre o ato de legis- lar. Em decorrência, o arbitramento do dano extrapatrimonial é metodologicamente diferente do dano material – fenômeno que enseja a releitura do termo inicial da incidência dos juros para a indexação da indenização por dano extrapatrimonial. 2 A PERSPECTIVA FUNCIONAL DA JURISDIÇÃO A separação absoluta dos poderes no Estado Legislativo re- servou uma atividade subalterna da jurisdição em relação ao Le- gislativo. Esse modelo de Estado 17 no qual a função judiciária era 17 No Estado Legislativo, a lei oriunda do parlamento era a fonte do direito que conferia segurança ju- rídica e derrotava todas as possíveis lacunas dogmáticas. Essa concepção a respeito do próprio direito transformava o Judiciário em órgão interlocutor, que, por uma interpretação cognitivista – que meramente declarava a vontade da legislação – reduzia a função do juiz a um exegeta descobridor da literalidade da legislação para o caso concreto. Somente uma visão crítica da função jurisdicional permite dinamizar os demais institutos do processo e, finalmente, conferir uma capacidade de atualização da jurisdição con- forme as implicações do Estado Constitucional. Ora, a elevação do contraditório a um caráter material, a exaltação da fundamentação com o dever de accountability e a importância da transição da jurisprudência aos precedentes das Cortes demonstram que a jurisdição alavanca um papel de relevo por sobre a própria atividade legislativa. A segurança jurídica já não depende da univocidade do texto da lei, mas do sentido e unidade do direito conferidos pela consistência das decisões exaradas pelas Cortes – instituições compro- metidas com a jurisdição em uma matriz constitucionalista. FEIJÓ, Maria Angélica. A visão da jurisdição

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