Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 37-61, Set.-Dez. 2021 51 Por exemplo: em um processo de guarda de menor entre os genitores, a mãe alega que o filho deve ficar com ela porque o pai é usuário de drogas. Não pode essa prova ser emprestada para o processo penal, uma vez que o thema probandum de uma é a relação com o filho de educação, sustento, alimentação, etc., e na outra, um fato ilícito específico, limitado pela data, local e modus operandi . Assim, o fato probando dos processos não é o mesmo, ainda que tangencie uma alegação central comum. Aqui cabe um último comentário. Alguns doutrinadores defendem que o âmbito de cognição dos processos deve ser o mesmo, razão pela qual não aceitam uma prova emprestada vin- da de um processo cautelar para um processo de conhecimento, já que naquele a cognição é rarefeita, enquanto neste a cognição é exauriente 34 . Com a devida vênia, pensamos o contrário. O âmbito de cognição do processo em nada afeta a produção da prova e seu contraditório, desde que, por óbvio, a prova não tenha sido pro- duzida inaudita altera parte . O que se restringe nesse momento é o grau de confirmação de um enunciado fático trazido ao pro- cesso, já que, no processo cautelar, basta que se apresentem in- dícios para se conseguir o pleito liminar, enquanto, no processo de conhecimento (ação penal principal), exige-se um standard de prova deveras elevado, conhecido como o “além da dúvida ra- zoável” ( beyond a reasonable doubt ). Imagine que em um pedido cautelar incidente de sequestro de um proveito do crime (art. 125 do CPP), uma testemunha con- firma que uma pessoa foi até sua loja para vender uma suposta bolsa antiga de família, que, em verdade, foi produto de roubo. Nada impede que essa prova seja utilizada na ação penal prin- cipal pelo Ministério Público. O mesmo se diga se estivermos diante de um processo cautelar no âmbito do processo civil. Dessarte, o âmbito de cognição não afeta a admissibilidade da sua prova, mas sim a força probante que ela precisa ter para obter uma decisão em favor daquele que a produziu, sendo o mo- 34 BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo penal . 8ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil. 2020. p. 441.
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