Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
207 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021 A clareza da norma, com efeito, é atributo que somente se pode associar ao resultado do processo unitário de interpreta- ção-aplicação do Direito, e não à leitura prévia e isolada que se faz de uma específica regra. 53 Por mais singela que pareça a lite- ralidade de um dado enunciado normativo, somente o seu cotejo com as demais normas e valores do sistema permitirá ao intér- prete individualizar a normativa do caso concreto. A noção de facilidade (dos casos), por sua vez, pretendia in- dicar que a subsunção resolveria satisfatoriamente a generalidade das hipóteses, relegando-se o recurso à ponderação para os casos que envolvessem conflitos insolucionáveis pelos elementos tradi- cionais de interpretação e de resolução de antinomias. Diante das premissas adotadas, todavia, impõe-se o reconhecimento de que a distinção entre casos fáceis e casos difíceis é “arbitrária e injusti- ficada” (TEPEDINO, 2018, p. 330), não competindo ao intérprete propor uma tal distinção e, com isso, restringir a ponderação ao segundo grupo de casos (SOUZA, 2014, p. 86-87). A adequada resolução de qualquer caso concreto demanda o sopesamento de todas as normas contidas no sistema jurídico, ainda que o resul- tado final se assemelhe àquele que decorreria da operação mecâ- nica de subsunção do fato à norma (PERLINGIERI, 2015, p. 68). Em suma, caso se pretenda manter a qualificação difícil aos casos que demandam emprego da ponderação, a conclusão inevitável estará no sentido de que todos os casos são difíceis . Nesse ponto do raciocínio, chega-se a uma questão para- lela e igualmente relevante à compreensão do que se denomi- nou inconstitucionalidade no caso concreto : trata-se de determinar o âmbito de incidência da ponderação, de modo a indicar se o recurso a tal técnica deve estar restrito aos conflitos entre princí- pios ou se, ao revés, seria possível estendê-lo aos conflitos entre princípios e regras ou mesmo de regras entre si. A afirmação do âmbito restrito de incidência da ponderação tem como pressu- posto a distinção forte entre regras e princípios: se as regras são comandos definitivos que se aplicam pela lógica da exclusão, 53 A elucidar que a clareza deve ser sempre considerada um posterius (e não um prius ) no processo inter- pretativo, v. PERLINGIERI, 2008, p. 616.
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