Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
202 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021 logístico, por se reconhecer que a mera subsunção do fato à nor- ma-regra mais específica pode vir a gerar resultados tidos por incompatíveis com a axiologia do ordenamento. Tal percepção, conquanto gradativamente mais expressiva, ainda causa relativo espanto ao intérprete-operador do Direito acostumado a pensar que a afirmação abstrata da constitucionalidade (o que se pode associar, ainda que indiretamente, à simples ausência de decla- ração de inconstitucionalidade) tem o condão de determinar a imediata aplicação da regra ao caso que a mesma supostamente se destinaria a regular. Imbuída de tal preocupação, parcela da doutrina consti- tucionalista tem envidado esforços de modo a justificar que a solução de um dado caso concreto que decorreria da aplicação (subsuntiva) da regra pode, excepcionalmente , ser afastada quando restar concretamente demonstrada a incompatibilidade da es- pecífica norma com a axiologia constitucional. Afirma-se, nessa linha de sentido, que o princípio (ou postulado ) da razoabilidade atribui ao julgador o poder-dever de graduar o peso da norma a ser aplicada, em busca da efetiva promoção da justiça do caso concreto . 40 A justa solução de um caso demandaria, em tais casos ditos excepcionais , a adequada conformação da norma aos valores tutelados pelo ordenamento jurídico. 41 Ainda com base na razoabilidade (dessa vez entendida como postulado normativo aplicativo ou norma de segundo grau) (ÁVILA, 2015, p. 194 e ss.), sustenta-se que a correta aplica- ção de toda norma-regra depende da análise das peculiaridades do caso concreto, a fim de se perquirir a compatibilidade entre a finalidade justificadora da norma e as circunstâncias específicas do caso sob análise (ÁVILA, 2015, p. 197; PERLINGIERI, 2008, p. 574). Assim, na hipótese de restar demonstrado que o caso con- 40 “O princípio [da razoabilidade] pode operar, também, no sentido de permitir que o juiz gradue o peso da norma, em uma determinada incidência, de modo a não permitir que ela produza um resultado in- desejado pelo sistema, assim fazendo a justiça do caso concreto” (BARROSO, 2006p. 363). A proposta de aproximação da razoabilidade à produção da justiça do caso concreto é relatada, com mais detalhada bibliografia, por PEREIRA, 2011, p. 202-203. Em sentido semelhante, v., ainda, LEITE, 2012, p. 111-112. 41 Em perspectiva civil-constitucional, Giovanni Perlingieri sustenta que da razoabilidade decorre a ex- igência de conformação das disposições legais aos valores do sistema jurídico (PERLINGIERI, 2015, p. 66-85). V., ainda, TEPEDINO, 2017, passim e, em especial, p. 35-36.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz