Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021

195  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021  e promovidas na maior medida possível, ainda que isso implique reconhecer que uma dada aplicação possível (e, talvez, a mais re- corrente) da regra pode vir a ser afastada, mediante decisão de- vidamente fundamentada, caso não guarde compatibilidade com o inteiro ordenamento jurídico em sua unidade e complexidade. 4. NOTAS SOBRE A INSUFICIÊNCIA DO CONTROLE ABS- TRATO DE CONSTITUCIONALIDADE O delineamento de algumas premissas teóricas referentes ao conteúdo e às espécies de norma jurídica, a que se dedicou nos itens precedentes, buscou lançar as bases sobre as quais será investigada a hipótese, aventada no seio da doutrina constitu- cionalista, concernente à possibilidade de se reputar inconstitu- cional, no caso concreto, uma dada aplicação da norma jurídica abstratamente considerada constitucional. Trata-se da chamada inconstitucionalidade no caso concreto , hipótese que desponta como símbolo de uma questão tão mais elementar quanto menos per- cebida pela doutrina: a necessidade de diálogo entre a metodolo- gia civil-constitucional e o sistema brasileiro de controle de cons- titucionalidade das leis. Nota-se, desde logo, que a investigação da denominada inconstitucionalidade no caso concreto pressupõe a compreensão preliminar dos mecanismos de controle de constitucionalidade de que dispõe o sistema jurídico brasileiro. Como é cediço, o controle de constitucionalidade foi concebido para aferir, sob a concepção de ordenamento jurídico como sistema hierarquica- mente escalonado, 25 a compatibilidade das normas infraconsti- tucionais com aquela que lhes serve de fundamento último de validade – a Constituição. 26 Diante da pluralidade de opções 25 Eis a síntese da construção kelseniana sobre a estrutura escalonada da ordem jurídica: “Se começarmos levando em conta apenas a ordem jurídica estatal, a Constituição representa o escalão de Direito posi- tivo mais elevado. A Constituição é aqui entendida num sentido material, quer dizer: com esta palavra significa-se a norma positiva ou as normas positivas através das quais é regulada a produção das normas jurídicas gerais” (KELSEN, 1994, p. 247). 26 Luís Roberto Barroso afirma, ao tratar do princípio da supremacia da Constituição : “A supremacia da Con- stituição é assegurada pelos diferentes mecanismos de controle de constitucionalidade. O princípio não tem um conteúdo próprio: ele apenas impõe a prevalência da norma constitucional, qualquer que seja ela. É por força da supremacia da Constituição que o intérprete pode deixar de aplicar uma norma incon- stitucional a um caso concreto que lhe caiba apreciar – controle incidental de constitucionalidade – ou o

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