Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
193 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021 na doutrina, no sentido de que as regras constituem mandados definitivos , por conterem comandos estritos que supostamen- te dispensariam o sopesamento com outras normas ou valores. Os princípios, por sua vez, são tidos por mandados de otimização , os quais visariam à promoção dos valores neles plasmados na maior medida possível, sem uma predeterminação dos meios necessários a tal desiderato. 22 Acoplada à identificação de regras e princípios com mandados definitivos e de otimização, respec- tivamente, encontra-se a noção, também recorrente, segundo a qual as regras teriam maior inspiração na segurança jurídica (tal como tradicionalmente concebida), enquanto os princípios esta- riam mais vocacionados à promoção da justiça em cada caso – o que se depreenderia da diferença de estrutura e de modo de apli- cação das referidas espécies normativas (BARCELLOS, 2005, p. 186; ÁVILA, 2015, p. 147-149). Sem embargo do valor didático da distinção e, sobretudo, da importância histórica da afirmação do caráter normativo dos princípios, os tradicionais critérios distintivos entre as duas es- pécies normativas não passam imunes a críticas na doutrina. 23 Argumenta-se, por exemplo, em proposta autoproclamada heu- rística , que as normas necessariamente são construídas pelo in- térprete a partir da qualificação dos significados extraídos dos enunciados normativos em cotejo com a consideração de valores os mais variados. 24 Referida proposta funciona como modelo ou hipótese provisória de trabalho para uma posterior reconstrução 22 Para uma síntese da distinção tradicionalmente atribuída a Ronald Dworkin e Robert Alexy, v. SOUZA, 2014, p. 86. 23 Para uma análise crítica de cada um dos critérios usualmente adotados para a distinção entre regras e princípios, v. ÁVILA, 2015, p. 60-87. 24 Eis a proposição de Humberto Ávila: “A proposta aqui defendida pode ser qualificada como heurística. Como já foi examinado, as normas são construídas pelo intérprete a partir dos dispositivos e do seu sig- nificado usual. Essa qualificação normativa depende de conexões axiológicas que não estão incorporadas ao texto nem a ele pertencem, mas são, antes, construídas pelo próprio intérprete. Por isso a distinção entre princípios e regras deixa de se constituir em uma distinção quer com valor empírico, sustentado pelo próprio objeto da interpretação, quer com valor conclusivo, não permitindo antecipar por completo a significação normativa e seu modo de obtenção. Em vez disso, ela se transforma numa distinção que privi- legia o valor heurístico, na medida em que funciona como modelo ou hipótese provisória de trabalho para uma posterior reconstrução de conteúdos normativos, sem, no entanto, assegurar qualquer procedimento estritamente dedutivo de fundamentação ou de decisão a respeito desses conteúdos” (ÁVILA, 2015, p. 91- 92). O autor arremata: “A proposta aqui defendida diferencia-se das demais porque admite a coexistência das espécies normativas em razão de um mesmo dispositivo” ( Ibid ., p. 92).
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