Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021
192 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021 dado normativo e fato no processo complexo de individuação da normativa do caso concreto (TEPEDINO, 2017, p. 35-36). Nos termos em que usualmente concebida, não bastasse restringir-se à aplicação de princípios, a técnica da ponderação resta limitada à resolução dos ditos casos difíceis . 19 O recurso à ponderação apenas se faria necessário, desse modo, quando os mecanismos tradicionais de interpretação e de solução de con- flitos normativos não se revelassem suficientes à adequada re- solução de um caso concreto envolvendo princípios em rota po- tencial de colisão. 20 Em perspectiva civil-constitucional, contudo, reconhece-se que todo caso concreto, por demandar a considera- ção do inteiro ordenamento jurídico, poderia ser qualificado de difícil , o que acarreta a autêntica desnecessidade ( rectius : impro- priedade) do recurso à classificação de casos fáceis em oposição a casos difíceis (SOUZA, 2014, p. 86-87). Não bastasse a dificul- dade teórica ínsita à referida distinção, a sua artificialidade con- sagraria, ainda, indesejável risco de arbitrariedade judicial, vez que findaria por caber ao julgador a definição da dificuldade ou facilidade do caso, como se lhe fosse dado escolher quando levar ou não em consideração o inteiro ordenamento jurídico. 21 Tecidas considerações mais pormenorizadas acerca da ponderação, cumpre retomar a análise dos supramencionados critérios mais utilizados para distinguir regras e princípios – estrutura normativa e modo de aplicação. A assunção de tais critérios em caráter rígido conduz à observação, encontradiça 19 “(...) consiste ela [a ponderação] em uma técnica de decisão jurídica, aplicável a casos difíceis, em rela- ção aos quais a subsunção se mostrou insuficiente” (BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo , 2010, p. 335). Nesse sentido, v., ainda, DWORKIN, 1977, p. 81 e ss. Parece mais adequado concluir, todavia, pela necessidade de superação geral da subsunção, dada a sua insuficiência para a con- sideração de toda a complexidade do ordenamento jurídico a incidir em todo e qualquer caso concreto, como destaca KONDER, 2015b, p. 208. 20 Nesse sentido, Ana Paula de Barcellos conceitua a ponderação como “(...) a técnica jurídica de solução de conflitos normativos que envolvem valores ou opções políticas em tensão, insuperáveis pelas formas hermenêuticas tradicionais” (BARCELLOS, 2005, p. 23). 21 Apesar da diversidade de matrizes metodológicas, semelhante advertência está contida na crítica for- mulada por Lenio Luiz Streck: “Cindir hard cases e easy cases é cindir o que não pode ser cindido: o com- preender, com o qual sempre operamos, que é condição de possibilidade para a interpretação (portanto, da atribuição de sentido do que seja um caso simples ou um caso complexo). Afinal, como saber se estamos em face de um caso simples ou de um caso difícil? Eis, aqui, a pergunta fulcral: já não seria um caso difícil decidir se um caso é fácil ou difícil?” (STRECK, 2012, item 2).
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