Revista da EMERJ - V. 23 - N. 3 - Setembro/Dezembro - 2021

191  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 3, p. 181-215, Set.-Dez. 2021  referida técnica em três etapas sucessivas. 16 Sem embargo das peculiaridades características de cada formulação teórica, pode- -se afirmar que o seu ponto de convergência consiste na identi- ficação prévia dos fatos e enunciados normativos alegadamen- te relevantes para, na sequência, promover o sopesamento dos valores e normas em rota de colisão e, com isso, extrair a justa solução do caso concreto. 17 Em que pese o louvável propósito didático, não parece de todo adequado conceber a consideração do dado normativo e dos elementos fáticos em etapas distintas, sob pena de consagra- ção do que já se referiu por uma indesejada subsunção qualifica- da . 18 Impõe-se, ao revés, a superação do formalismo que parece subjazer a uma tal ordem de compreensão da técnica da pon- deração, reconhecendo-se que o processo unitário de interpreta- ção-aplicação do Direito traduz uma indissociável ligação entre 16 A título ilustrativo, Humberto Ávila propõe que a ponderação se constitui das seguintes etapas: “(i) a preparação da ponderação (análise o mais exaustiva possível de todos os elementos e argumentos per- tinentes); (ii) a realização da ponderação (fundamentar a relação estabelecida entre os elementos objeto de sopesamento); e (iii) reconstrução da ponderação (formulação de regras de relação com pretensão de validade para além do caso)” (ÁVILA, 2015, p. 186-187.). Ana Paula de Barcellos igualmente propõe a de- composição da ponderação em três etapas sucessivas, porém em formulação distinta: “Na primeira delas, caberá ao intérprete identificar todos os enunciados normativos que aparentemente se encontram em con- flito ou tensão e agrupá-los em função da solução normativa que sugerem para o caso concreto. A segunda etapa ocupa-se de apurar os aspectos de fato relevantes e sua repercussão sobre as diferentes soluções in- dicadas pelos grupos formados na etapa anterior. A terceira fase é o momento de decisão: qual das soluções deverá prevalecer? E por quê? Qual a intensidade da restrição a ser imposta às soluções preteridas, tendo em conta, tanto quanto possível, a produção da concordância prática de todos os elementos normativos em jogo?” (BARCELLOS, 2005, p. 92). Em sentido semelhante a esse último, v. BARROSO, 2010, p. 334-339. 17 A propósito do objeto da ponderação, Humberto Ávila sustenta que podem ser objeto de sopesamento os mais variados elementos, como os bens jurídicos, os interesses, os valores e os princípios (ÁVILA, 2015, p. 185-187). 18 A expressão remonta à lição de Eduardo Nunes de Souza, que adverte para os riscos de utilização in- devida da técnica da ponderação: “Nessa perspectiva, aliás, resta claro que a técnica da ponderação como mecanismo de solução de casos em que dois princípios indicam soluções antagônicas corresponde, muta- tis mutandis , a uma espécie de subsunção qualificada: tratar-se-ia de um procedimento para harmonizar a complexidade do ordenamento (em casos não solucionáveis pelo mecanismo do ‘tudo-ou-nada’) após o qual seria possível aplicar ao caso concreto o equilíbrio encontrado entre os princípios originalmente colidentes como se fosse uma premissa maior – lógica que não dista do raciocínio silogístico. Em outras palavras, a ponderação funciona como uma forma mais complexa de se encontrar a premissa maior, ex- igida por determinados casos, ditos difíceis. Semelhante postura hermenêutica não corresponde, como se vê, a uma superação da subsunção, padecendo das mesmas críticas que o direito civil-constitucional dirige à técnica subsuntiva” (SOUZA, Eduardo Nunes de. Merecimento de tutela, 2014, p. 88). O autor conclui: “Não significa, cumpre ressaltar, que a ponderação não ocorra na metodologia civil-constitucional, mas, ao contrário, que ela ocorre, a rigor, o tempo todo. Não são, em outros termos, excepcionais ou especiais as hipóteses em que é necessário compatibilizar princípios – o intérprete o faz o tempo todo. Reconhecida essa ressalva, toda a técnica relacionada ao balanceamento revela-se de grande utilidade ao hermeneuta” ( Ibid ., p. 88-89).

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