Revista da EMERJ - V. 23 - N. 2 - Abril/Junho - 2021

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 86-101, Abr.-Jun. 2021  93 vel em neutralizar milhões de pessoas, ou até mesmo em matar alguns, tudo em nome da segurança pública. O devido processo legal substancial e o princípio acusató- rio devem se prestar a impor limites à atuação do Estado-juiz, iluminando e direcionando as regras do processo penal. Não se admite, em busca de um suposto bemmaior, qual seja, o resguar- do da segurança pública, a busca da “verdade real”, de forma indiscriminada e ilimitada, com ofensas aos direitos individuais da liberdade, privacidade e da intimidade da vida privada. Não se pode admitir provas ilícitas, ou mesmo a transposi- ção da figura do Estado-acusador e do Estado-julgador em busca dos meios de provas comprobatórios das circunstâncias fáticas descritas pela autoridade policial, de forma indiscriminada e sem qualquer controle, pelo enfraquecimento da defesa na fase investigatória, sob pena de termos um processo viciado e conta- minado e com o resultado previsível, e até certo ponto, almejado, a fim de estabelecer a verdade do dominador para controle dos excluídos e indesejados, o que corresponde ao estado autoritário e policialesco. O Poder Judiciário, bastião do Estado Democrático de Di- reito, não pode ser contrário ao estabelecimento do “juiz das ga- rantias”, sob pena de referendar e chancelar o Estado autoritário que ainda alicerça o sistema de justiça criminal. Não se justifica, portanto, o argumento de que todo magis- trado, em sua atividade judicante, teria como função precípua a garantia dos preceitos constitucionais, e assim não seria necessá- ria a fragmentação entre o juiz responsável pela coleta das pro- vas e o juiz julgador. Esse argumento é superficial. Por óbvio, todo juiz deve ser garantidor de direitos. Sua imparcialidade, porém, somen- te será observada com o afastamento da função decisória da- quele juiz responsável pela coleta das provas na fase de per- secução penal, através das quais se busca a comprovação das circunstâncias fáticas do delito e indícios de autoria do crime, ou seja, a justa causa.

RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz