Revista da EMERJ - V. 23 - N. 2 - Abril/Junho - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 86-101, Abr.-Jun. 2021 91 A partir dessa premissa, deve-se entender que a força nor- mativa de uma Constituição democrática depende diretamente do reconhecimento do caráter de pessoa do ser humano: “para reivindicar, resgatar e dar peso de convicção à tese de que toda Constituição investe força normativa direta, há que incluir em seu conteúdo a parte que resolve o status situacional da pessoa, em que o Estado democrático reconhece a dignidade humana, a liberdade e os direitos, prestando-lhes a tutela e assegurando a promoção... o conteúdo principialista de direitos e liberdades é o que ostenta centralidade e maior valor no Estado democrático”. (German J. Bidart Campos, El Derecho de la constituición y su fuerza normativa, Buenos Aires, 1995, pp. 76-76). Está aí a principal barreira ao juiz das garantias. A es- sência do tratamento diferenciado que se atribui ao inimigo. O direito nega ao inimigo do Estado a sua condição de pessoa. Ele é considerado para o sistema político e de justiça cri- minal como ente perigoso. Por mais que a ideia seja heterodoxa, ao se propor estabelecer a distinção entre cidadãos (pessoas) e inimigos (não pessoas), faz-se referência a seres humanos que são privados de certos direitos individuais, motivo pelo qual dei- xaram de ser considerados pessoas, e esta é a primeira incompa- tibilidade que se apresenta para aceitação aos hostis em regimes de governos que se defrontam hodiernamente como o princípio do Estado Democrático de Direito. Anegação jurídica da condição de pessoa ao inimigo é uma característica do tratamento penal que lhe é conferido no sistema de justiça criminal próprio do regime inquisitorial e autoritário. Zaffaroni esclarece que: “se na realidade, o direito penal sempre aceitou o conceito de inimigo e este é incompatível com o Estado de Direito , o que na verdade seria adequado seria uma renovação da doutrina penal corretora dos componen- tes autoritários que a acompanharam ao longo de quase todo o seu percurso ou, em outras palavras, um ajuste do direito penal que compatibilize com a teoria política que corresponde ao Estado constitucional de direito, depuran-
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