Revista da EMERJ - V. 23 - N. 2 - Abril/Junho - 2021

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 86-101, Abr.-Jun. 2021  90 cinto Coutinho), pois não basta a mera separação inicial das funções de acusar e julgar, precisamos manter o juiz afastado da arena das partes e, essencialmente, atribuir a iniciativa e gestão da prova às partes, nunca ao juiz, até o final do pro- cesso. Um juiz-ator funda um processo inquisitório; ao passo que o processo acusatório exige um juiz-espectador”. Só podemos admitir, assim, tamanha morosidade em reco- nhecer e implementar eficazmente o sistema acusatório no pro- cesso penal brasileiro aos resquícios de um Estado autoritário que sempre se utilizou do sistema de justiça penal como meca- nismo de controle de excluídos e marginalizados. Mais uma vez podemos nos socorrer da obra citada, de autoria de Aury Lopes Junior: “É elementar que, ao se atribuir poderes instrutórios ao juiz, fere-se de morte a imparcialidade. Transforma-se o processo em uma encenação simbólica, pois o juiz – desde o momento em que decidir ir atrás da prova de ofício – já tem definida a hipótese acusatória como verdadei- ra. Logo, como ensina Franco Cordeiro, esse juiz não decide a partir dos fatos apresentados no processo, senão da hipótese acusatória inicialmente eleita (pois se fosse a defensiva, ele não precisava ir atrás da prova). Quando o juiz, em dúvida, afasta o in dubio pro reo e opta por ir atrás da prova (juiz ator-inquisi- dor), ele decide primeiro e vai atrás de elementos que justificam a decisão que já tomou.”. A RESISTÊNCIA AO JUIZ DAS GARANTIAS Escreve Zaffaroni em sua obra O inimigo no Direito Penal: “O poder punitivo sempre discriminou os seres humanos e lhes conferiu um tratamento punitivo que não correspon- dia à condição de pessoas, dado que os considerava apenas como entes perigosos ou daninhos. Esses seres são assinala- dos como inimigos da sociedade e, por conseguinte, a eles é negado o direito de verem suas infrações sancionadas dentro dos limites do direito penal liberal, isto é, das garantias que hoje o direito internacional dos direitos humanos estabelece universal e regionalmente.”

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