Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 68-80, Jan.-Mar. 2021 75 acções simbólicas que visam a rememorar ou glorificar traumas passados (por exemplo, a realização de um cortejo nazi com a exi- bição de bandeiras com a cruz suástica num bairro judeu 13 ); etc. Podemos enquadrar aqui o preceituado no artigo 240.º, n.º 2, alíneas b) e c) , do CP, que proíbe penalmente condutas, que tenham lugar na esfera pública, de difamação, injúria e ameaça de pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor, origem étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência física ou psíquica. Note-se que o legislador penal português foi mais longe do que aquilo que era imposto pela Decisão-Quadro de 2008, tendo atribuído relevo típico a acções de difamação, injúria e ameaça que não constituam um incitamento à discriminação ou à violência. Ainda que se aceite que manifestações dessa natureza pos- sam ser sujeitas a restrições limitadoras da liberdade de expres- são e até mesmo a proibições penais, sempre subsistirá a dificul- dade de segregar aquilo que, de facto, ultrapassa o permitido pela liberdade de expressão. As expressões discriminatórias apa- recem frequentemente integradas em manifestações de posições que englobam expressões de crítica social e política que deverão considerar-se protegidas pelo direito à liberdade de expressão, mesmo quando recorram a uma linguagem agressiva ou grossei- ra. Com efeito, frequentemente será difícil discernir onde termi- na a crítica legítima, ainda que repugnante ou chocante, e onde começa a apologia do ódio. Dificuldade que se acentua no caso de o ódio discriminatório não ser diretamente percetível, resul- tando antes do subtexto do discurso. IV – A CRIMINALIZAÇÃO DO DISCURSO DE ÓDIO 7. Mesmo que se logre apontar os principais tipos de dis- cursos que merecerão ser tratados como discursos de ódio, sem- pre permanecerá em aberto a magna e controvertida questão da admissibilidade da sua criminalização . Como se viu, essa é questão que vem dividindo instituições internacionais, tribunais e auto- 13 Como sucedeu no famoso caso National Socialist Party of America v. Village of Skokie , julgado pelo Supre- mo Tribunal Federal dos EUA (432 U.S. 43 (1977)).
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