Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 45-67, Jan.-Mar. 2021 66 ao menos parcialmente – a impossibilidade de responsabilização última por conteúdos – v.g. comentários – anónimos lesivos de direitos (fundamentais e de personalidade). Mas uma política de neutralidade 63 como a advogada nos Estados Unidos da América 64 parece não ser também suficiente para acautelar os interesses em presença e justificar a intervenção governamental – ou supra governamental – sobre fornecedores de serviços ou providenciadores de meios de exercício de condu- ta ilícita e mesmo a eventual monitorização a priori de conteúdos (v.g. com recurso a filtros, como no caso do regime belga). Não tendo uma perspectiva ideologicamente neutra, o pa- norama vigente remete-nos meramente para a consideração da ausência de um dever geral de vigilância, não obstante a expres- sa previsão da responsabilidade – por acção ou omissão – em caso de simples transporte ou fornecimento de acesso, da res- ponsabilidade em caso de armazenagem temporária ou princi- pal, da responsabilidade por associação de conteúdos. “Os novos meios tecnológicos conseguiram, simultânea e paradoxalmente, alargar a liberdade de informação e desrespon- sabilizar os intervenientes” 65 . De facto, a ideia de sociedade trans- parente a que já aludimos mostra bem que a questão hoje em dia se deslocou da discussão sobre “o que cabe no âmbito de protec- ção” para a necessidade de tutela face a novos meios. “ Muitos dos que hoje falam e escrevem sobre os media não perceberam ainda que no universo da informação se deu recentemente uma mudança fundamental. Essa mudança teve que ver com o apa- recimento da Internet – que introduziu nessa área regras novas e novos modos de funcionamento. Antes de a Internet aparecer, existia sempre um filtro entre quem produzia a informação 63 Em 2010, um relatório emitido pela Federal Communications Commision – Preserving the free and open Internet - veio resumir a política da Internet a três regras básicas: transparency, no blocking and no unreaso- nable discrimination. FCC 10-201, disponível em: <http://hraunfoss.fcc.gov/edocs_public/attachmatch/ FCC-10-201A1.pdf>. 64 Com contornos, no entanto, de bastas contraditoriedades, como as resultantes dos casos wikileaks e Snowden. 65 Vejam-se ainda P aulo F erreira da C unha , “ Sociedade da Informação e Estado de Direito Democrático, Direito à Informação ou deveres de protecção informativa do Estado”, op.cit., p. 341, e Dominique Wolton, Internet et après ? , Paris: Flammarion, Coll. “Champs”, 2000 ( D ominique W olton , E depois da Internet? Para uma teoria crítica dos novos media , Lisboa: Difel, 2000).
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