Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 45-67, Jan.-Mar. 2021  58 cial permanentes, nomeadamente num tempo emque as ameaças aos direitos fundamentais que decorrem da eficácia horizontal – da comunidade – se apresentam provavelmente com tanta força como as que tradicionalmente correspondiam às ameaças esta- duais – eficácia vertical. Acresce que o direito à reserva é simultaneamente previsto como direito fundamental e como direito de personalidade: os pri- meiros relevamdo direito constitucional e pressupõem relações de poder, os direitos de personalidade relevam do direito civil e regu- lam tendencialmente relações de igualdade, os primeiros colocam a pessoa perante o poder público, os segundos apontam-lhe uma esfera autónoma de realização, mesmo face a outros cidadãos. A protecção da vida privada – mormente em contexto on- line 42 – projecta-se ainda na previsão do direito ao livre desen- volvimento da personalidade também previsto entre nós cons- titucionalmente. E uma das matérias hoje mais sensíveis quanto à delimita- ção ordinária da protecção da vida privada radica na “autodeter- minação informacional” a que se refere o artigo 35.º da CRP. Aconsideração das lesões deve ser avaliada in concretu, mas não prescinde de um juízo de adequação social que conforma a exigência de licitude. Ou seja, se todos realçamos a importância da protecção da vida privada na complexidade das relações jurí- dico-sociais, se têm aqui operância as teses quanto à vinculação do legislador ordinário pelos direitos fundamentais, há também que não ter medo de afirmar que se deve atender à chamada teo- ria das bagatelas como princípio de interpretação e conformação social: de facto, tal como o direito penal exclui a protecção típica quando entende não existir adequação social, é importante que percebamos que o âmbito de protecção do direito à reserva da vida privada exige hoje, no mundo actual, uma configuração ob- viamente distinta daquela a que se referia Brandeis no final do século XIX. Mormente no cenário online. 42 Poderemos ver como claras violações da reserva da intimidade de vida privada a obtenção de dados pessoais sem autorização do respectivo titular, nomeadamente através da aposição de cookies – históricos de navegação.

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