Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 45-67, Jan.-Mar. 2021 48 Sucede que essa – quod erat demonstrandum – ciberdemo- cracia, que enlaça a sociedade da informação, impõe exigências diferenciadas ao ramo de Direito que delas se ocupa, dada a ne- cessidade de contemporização com a reserva do “tecnologica- mente possível” 12 e a inexistência de claros limites espaciais de aplicação normativa. Assim, se a protecção da individualidade da pessoa em contexto cibernético deve ser a continuidade da protecção garan- tida pelo Estado na realidade offline, a imaterialidade 13 convo- ca todavia desafios acrescidos. Trata-se pois de saber se é ainda possível a utilização dos “odres velhos” para conter e disciplinar o “vinho novo” da Internet 14 , em especial quanto à susceptibili- dade de aplicação da dogmática comum da responsabilidade civil e penal e da protecção dos direitos fundamentais à reali- dade fáctica da Internet, em particular no que respeita aos conteúdos gerados em contexto que não diferenciam o emissor e o receptor de informação ( produsers ) 15 . Fundamentalmente, a discussão da responsabilização pela liberdade de expressão e informação digital online – rectius , pela respetiva possível ilícita violação – encontra escolhos na imen- sidão da informação disponível, não filtrada, constantemente actualizada e virtualmente impossível de apagar 16 , contribuin- do para a qualificação de Castells de sociedade em rede ou para aquilo a que Domingos Farinho já qualificou como “verdadei- 12 Sobre esse conceito, leia-se C arla A mado G omes , “Estado Social e concretização de DF na era tecnológi- ca ”, RFDUP, Coimbra: Coimbra Editora, A. 7, 2010, pp. 19-34. 13 C arla P rino , O enquadramento legal do facebook, dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas e Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, 2012. 14 Expressão celebrizada por M anuel C arneiro da F rada em “Vinho novo em odres velhos?»/A respon- sabilidade civil das «operadoras de Internet» e a doutrina comum da imputação de danos ”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 59, II, Abril de 1999), depois objecto de republicação em Direito da Sociedade de Informação , II, Coimbra: Coimbra Editora, 2001. 15 Para dilucidação do conceito, na terminologia de conceitos gerados por utilizadores (CGU), veja-se J oão F achana , A responsabilidade civil pelos conteúdos ilícitos…, pp. 30 ss. 16 A ‘reserva do tecnologicamente possível’ impede a real concretização do right to be forgotten (droit à l’oub- li ) em atual equação acrescida desde a repectiva previsão no artigo 17.º do Regulamento Geral de Proteção de Dados - Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados -, a que em Portugal acresce a consideração da Lei n.º 58/2019, de 8 de Agosto.
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