Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021
176 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 142-184, Jan.-Mar. 2021 vista “Gênero e Número”, realizada a partir de dados do Minis- tério da Saúde, 11 pessoas trans são agredidas por dia no Brasil (SILVA, V., 2020). Esses sim são fatos e dados os quais não se pode ignorar. Caso o STF decida por impedir que mulheres transgênero utilizem banheiros femininos, desencadear-se-ão uma série de reações para essas cidadãs brasileiras que, em verdade, poten- cialmente põem em risco direitos e garantias desses “novos su- jeitos de direitos”. Objetiva e categoricamente, depreende-se, a partir de uma cadeia lógica de reflexão consequencial, que se o ordenamento jurídico negar que mulheres transgênero utilizem o banheiro feminino, elas terão de utilizar o masculino. Utilizan- do o banheiro masculino, oras, estariam essas mulheres expostas não somente às arbitrariedades do machismo, mas também às da transfobia. Destaca-se, nesse sentido, o que aconteceria caso uma mulher trans, que performe feminilidade em sua máxima potência, fosse coagida pelo ordenamento a entrar num banheiro masculino. Já no ato de adentrar o recinto, subjetivamente, aque- la mulher teria sua honra violada, pois não há como se respeitar a honra de um indivíduo se não se respeita a imagem através da qual ele se apresenta. Ademais, o Estado estaria rebaixando aquele sujeito a uma categoria inferior à de “mulher legítima” – essa categoria a qual se restringiria a mulheres cisgênero que performam feminilidade – e retirando-a sua autonomia de exer- cer seus direitos como tal, violando, assim, sua dignidade huma- na. Estar-se-ia ratificando que elas não são “tão mulheres quanto as mulheres cis” e, mais ainda, validar-se-ia que os banheiros sejam separados por sexo, e não por gênero. Nesse sentido ain- da, deve-se antecipar como essa mulher seria recepcionada pelos homens cisgênero nesses banheiros. Piadas morais, ofensas pes- soais, violência física, violações e estupros são, corriqueiramen- te, elementos que acompanham as manchetes de jornais em se tratando da população transgênero feminina nas próprias ruas; imagine-se, assim, como seriam em banheiros (esses os quais, apesar de serem públicos, são delimitados por paredes as quais cercam homens num ambiente na qual a virilidade se aflora e a
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