Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021
168 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 142-184, Jan.-Mar. 2021 nos punhos etc”, invisibiliza-se outras tantas possibilidades que podem despontar dos anseios de tantos outros sujeitos. 37 Nessa esteira, ressalta-se um dos eixos centrais deste arti- go, que pode ser extraído a partir da reflexão sobre as seguintes indagações: apropriar-se de símbolos tidos como “femininos” e ornamentar-se de acordo com tal estereótipo é uma condicionan- te justa e teoricamente eficaz para determinar, portanto, quem é uma mulher? Não se estaria reforçando os padrões estético-com- portamentais impostos pela dominação masculina quando os moldes tidos como “femininos” fossem legitimados como fonte de validação de feminilidade? Como já exposto, há indivíduos que transgridem o para- doxo sexual fundamental ao distanciarem-se das categorias es- tigmatizantes dos gêneros impostos em virtude do sexo. Além disso, há aqueles que se distanciam, também, do seu próprio sexo, ou seja, da genitália biológica. Essas distanciações se de- vem em razão dos mais variados motivos, cabendo à psicologia aprofundar-se nesse quesito. À comunidade jurídica interessa a compreensão de como os direitos dos “novos sujeitos de direi- tos” devem ser efetivamente tutelados. Num primeiro prisma, já que novas possibilidades de res- significações dos próprios sexos e dos gêneros vêm constante- mente emergindo, deve-se trazer à luz a composição dos corpos 37 Aqui é importante que se suscite um ponto o qual não será exposto mais adiante de forma tão caute- losa, necessária e detalhada. A partir da definição que fora estabelecida acima, lança-se mão de enfatizar que as problemáticas sobre “ser mulher” não se resumem às pessoas transgênero. Há casos de mulheres cisgênero cuja percepção de si enquanto sujeito desvincula-se dos padrões estético-comportamentais que se espera de sua performance. Nesse sentido, mulheres cisgênero cujas características sejam dissocia- das das redigidas e exemplificadas acima serão chamadas de “masculinas”, “esquisitas”, “desleixadas”, “porcas”, “estranhas” etc. Além disso, é de suma importância destacar que a sexualidade dessas mu- lheres também será posta à prova. À medida que se estabeleceu que o paradigma “mulher-vagina” e “homem-pênis” fosse complementado pela palavra “heterossexual”, inseriu-se nas discussões de gênero e sexo a sexualidade, exigindo que os indivíduos não somente se comportassem como se esperava que se comportassem em virtude da genitália, mas que, ainda, se relacionassem amorosa e sexualmente com o sexo/gênero oposto àqueles aos quais pertenciam. A sexualidade é entendida como a manifestação sexual do sujeito; isto é, o modo como ele se relaciona com outros sujeitos de sua comunidade. Ela nada tem a ver com o gênero do sujeito nem com o seu sexo. São institutos completamente dissociados no que se refere à sua manifestação no indivíduo em si. Contudo, muito se confunde os três, associando-os intrin- secamente muito em virtude da visão cis-hetero-normativa na qual nossa sociedade se inscreveu. A título de esclarecimento e de ilustração, cite-se, aqui, um exemplo de mulher trans, ressaltando sua respectiva sexualidade. Duda Salabert é uma professora mineira e primeira pessoa transexual a se candidatar ao Senado Federal; casada com uma mulher e mãe de uma filha – nota-se como o gênero de Duda nada tem a ver com sua orientação sexual (mulher trans lésbica).
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NTgyODMz