Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021

157  R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 142-184, Jan.-Mar. 2021  dispositivos da CF/1988. O STF posicionou-se de modo favorá- vel à tese de violação de matéria constitucional, seguindo o re- lator, min. Barroso, vencidos os ministros Marco Aurélio e Teori Zavascki. Não se manifestaram os ministros Gilmar Mendes e Cármen Lúcia 21 . 1.2.2.2.2 Verificação de repercussão geral O art. 102, § 3º da CF/1988 definiu que, para que um caso seja julgado mediante Recurso Extraordinário na Suprema Cor- te brasileira, ele deve ser dotado de um caráter transcendental para a resolução de insurgência; isto é, ele deve ultrapassar o caso concreto em questão e expressar, por isso, uma “repercussão geral” para toda a sociedade. Isso significa que, além de o caso violar dispositivos da Carta Magna, ele deve incidir sobre ou- tros de mesma natureza, em grande proporção. O Tribunal, por maioria, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencidos os ministros Marco Aurélio e Teori Zavascki. Não se manifestaram os ministros Gilmar Men- des e Cármen Lúcia 22 . Dessa prévia manifestação do Supremo, extrai-se o retrato da sociedade brasileira que muito se vê representada fielmente no mais importante tribunal brasileiro. Ao afastarem de si a res- ponsabilidade de se manifestar sobre a repercussão geral, bem como sobre a violação de matéria constitucional do RE 845.779, os ministros Gilmar Mendes e Cármen Lúcia se afastam de as- sumir as rédeas da efetivação de direitos fundamentais de ci- dadãos brasileiros e associam-se aos ministros Marco Aurélio e ao memorável ministro Teori Zavascki, que injustificadamente 21 Em sua manifestação, o relator destacou que o caso “Envolve a projeção social da identidade sexual do indivíduo, aspecto diretamente ligado à dignidade da pessoa humana e a diversos direitos da personalida- de (CRFB/1988, arts. 1º, III, e 5º, V e X)”, e que “Constitui, portanto, questão constitucional saber se uma pessoa pode ou não ser tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente.” (BARROSO, 2014, p. 10). 22 Defendeu o relator que: A subsistência do acórdão recorrido – que traz interpretação flagrantemente contrária aos dispositivos supracitados – seria uma regressão a todas as conquistas efetivadas por esta egrégia Corte, no sentido de proteger os direitos fundamentais e humanos das minorias sociais. E, não bastasse, a mantença da decisão recorrida abriria um arriscado precedente jurisprudencial, autorizando o Poder Judiciário a ignorar uma gama de direitos fundamentais assegurados pela ordem constitucional pátria, pilares básicos do Estado Social e Democrático de Direito. (BARROSO, 2014, p. 7).

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