Revista da EMERJ - V. 23 - N. 1 - Janeiro/Março - 2021

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 96-133, Jan.-Mar. 2021  102 de sua vigência. 5 Estabelece-se dual sistema: de um lado, a Lei 8.009/90 institui o bem de família legal, pela simples residência; e, de outro lado, o Código Civil, com menor abrangência prática, mantém a tradição privada em privilégio à vontade do proprie- tário do bem. Implementado o novo bem de família e ultrapassadas as discussões calcadas preteritamente em sua suposta inconstitu- cionalidade, 6 através da Lei 8.009/90, estabeleceu-se modelo umbilicalmente diverso daquele praticado anteriormente. Sua constituição passa a ser imediata e ex lege , desde que a situação concreta decorra das hipóteses legais. Nessa direção, já o art. 1º e seu parágrafo único 7 estabelecem alguns dos parâmetros à luz dos quais será possível averiguar em que hipóteses há que se falar na regra da impenhorabilidade. Trata-se de norma de ordem pública, cuja garantia pode ser alegada a qualquer momento no processo, e não necessariamen- te em embargos do devedor, de modo que o debate acerca da im- penhorabilidade do bem não se sujeita à preclusão. 8 Além de não fazer coisa julgada material, poderá, inclusive, ser conhecida de ofício pelo juiz em caso de silêncio das partes, exigindo-se natu- ralmente sejam ouvidas as partes em contraditório, e ficando, de modo geral, a cargo do devedor o ônus da prova de que se trata de bem de família (FACHIN, 2001, p. 159). Em contraposição ao bem de família estatuído no Código Civil, a proteção trazida na Lei 8.009/90 não traduz sua inaliena- 5 O entendimento foi assentado no Enunciado nº 205 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual: “A Lei 8.009/90 aplica-se a penhora realizada antes de sua vigência”. 6 Sobre o tema, houve quem afirmasse que a lei gozava de vício formal, por ter sido promulgada não pelo Presidente da República, mas pelo Presidente do Senado; e material, uma vez que teria gerado impacto indesejado nas relações negociais e incentivo à inadimplência. Tais questionamentos caíram por terra, to- mando-se como premissa o caráter social e de proteção à dignidade humana desenhado pela Lei 8.009/90. 7 Lei nº 8.009/90, “Art. 1º: O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei. Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.” 8 Sobre o tema, destaque-se os seguintes precedentes: STJ, 3ª T., AgRg no AREsp 595374/SP, Rel. Min. João Otávio De Noronha, julg. 2.8.2015, publ. DJe 1.9.2015; STJ, REsp 1313053/DF, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julg. 4.12.2012, publ. DJe 15.03.2013; e STJ, 1ª T., REsp 640703/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavas- cki, julg. 15.9.2005, publ. DJ 26.09.2005.

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