Revista da EMERJ - V. 22 - N.3 - Setembro/Dezembro - 2020
R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, p. 69-99, Setembro-Dezembro. 2020 74 Penal Constitucional apresenta-se como proposta de releitura do sistema punitivo estatal, tanto em termos dogmáticos, quan- to em termos de política criminal, o que abrange, com igual vigor, o processo de elaboração, reforma e aplicação concreta das normas penais. 10 3. BEM JURÍDICO E DIREITO PENAL ECONÔMICO-TRIBU- TÁRIO: A FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO PENAL Poucos temas ocupam mais espaço na literatura penal atual do que a teorização em torno da ideia de bem jurídico. De um modo geral, pode-se afirmar que o conteúdo das incrimina- ções têm, ou, ao menos, devem ter, relação direta com o mode- lo de Estado no qual se insere o Direito Penal. Daí o porquê de ser íntima a correlação existente entre a concepção de Estado e a teoria do Direito Penal, sobretudo no tocante à formulação da política criminal. Em termos evolutivos, o Direito Penal liberal, também cha- mado de tradicional ou clássico, formado sob a inspiração do Ilu- minismo, entre a segunda metade do século XVIII e a primeira do século XIX, configurou um sistema normativo voltado, ba- sicamente, para a tutela de interesses privados típicos da bur- guesia, então emergente, em face de ataques das camadas sociais miseráveis e das arbitrariedades do próprio Estado Absolutista. No entanto, principalmente após a 2ª Guerra Mundial, configurou-se uma espécie de ajuste de contas entre o direito, a economia, a política e a sociedade 11 , haja vista que os textos constitucional do Direito Penal: realidades e perspectivas. In: NETO, Cláudio Pereira de Souza; SARMEN- TO, Daniel (Orgs.). A constitucionalização dos direitos : fundamentos teóricos e aplicações específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 854. 10 Especificamente sobre o efeito das mudanças do modelo estatal sobre a atuação judicial no campo penal, vale a reprodução do desenho evolutivo a seguir traçado: “Do Estado de Direito tout court (clássico, liberal, legalista e formalista) passamos a um Estado constitucional e democrático de Direito. A principal consequência desta transformação tinha que (naturalmente) repercutir na posição do juiz dentro do Estado de Direito: da concepção puramente ´formalista´ de juiz (juiz legalista), que não podia outra coisa senão pronunciar as palavras da lei (“la bouche qui prononce les paroles de la loi”), chega-se ao protagonismo dos juízes, que manejando os valores e princípios constitucionais que deve alcançar o sentido do justo em cada caso concreto, justificando sua decisão com critérios de razoabilidade (ou ponderação ou proporcio- nalidade)”. GOMES, Luiz Flávio; GARCÍA-PABLOS MOLINA, Antonio; BIANCHINI, Alice. Direito Penal. V. I: introdução e princípios fundamentais. São Paulo: RT, 2007, p. 54. 11 STRECK, Maria Luiza Shäfer. Direito penal e Constituição : a face oculta da proteção dos direitos funda- mentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009, p. 20.
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