Revista da EMERJ - V. 22 - N.3 - Setembro/Dezembro - 2020

 R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 22,n. 3, p. 334-363, Setembro-Dezembro. 2020  345 “(...) a tipificação penal produz também discriminação social, já que prejudica, de forma desproporcional, as mulheres pobres, que não têm acesso a médicos e clínicas particulares, nem podem se valer do siste- ma público de saúde para realizar o procedimento abortivo . Por meio da criminalização, o Estado re- tira da mulher a possibilidade de submissão a um procedimento médico seguro. Não raro, mulheres pobres precisam recorrer a clínicas clandestinas sem qualquer infraestrutura médica ou a procedi- mentos precários e primitivos, que lhes oferecem elevados riscos de lesões, mutilações e óbito . 22 (gri- fo nosso) Inegável a consciência absoluta do Ministro Luís Roberto Barroso com os aspectos que dizem respeito à ótica científica, à Carta Magna e aos Tratados Internacionais, além de atender às orientações normativas do Ministério da Justiça. Barroso fun- damenta a sua arguição acerca do voto à luz de três questões objetivas: a científica, a social e a jurídica. Sob o lume da ciência, tem-se que até a décima segunda semana o sistema nervoso cen- tral não está totalmente formado e, nessa ótica, o ser humano inexiste, pois ainda não é capaz de desenvolver as atividades do cérebro, na medida em que o mesmo não está completamente formado. No que tange à alegação do caráter social, torna-se ne- cessário conhecer os contextos sociais em que vivem essas mu- lheres para usarem as práticas abortivas. Isso porque o aborto é praticado por cidadãs de todas as classes sociais. No entanto, não se deve deixar de assinalar a baixa escolaridade e o baixo poder aquisitivo, que estão, direta ou indiretamente, associados ao maior número de abortos. À vista disso, aos contextos cientí- ficos é adicionada a ausência da justiça social, que se materializa também na discriminação existente na sociedade. Segundo a pesquisa feita pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), o número de abortos realizados no Bra- sil pode ultrapassar um milhão de mulheres. A pesquisa mostrou 22 BARROSO, Luís Roberto. HC 124.306.

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